Um cenário polar é o palco do drama Soundtrack, no qual um fotógrafo, Cris, interpretado por Selton Mello, tenta se reconectar consigo mesmo a partir de uma viagem a uma estação de pesquisa na neve – na verdade, produzida artificialmente, numa locação na Barra da Tijuca -, onde ele realizará uma série de fotos,visando uma exposição.
Na estação de pesquisa, num local indeterminado, Cris encontra pessoas de diversas partes do mundo – como o inglês Mark (Ralph Ineson, de A Bruxa), com quem dividirá o alojamento, e o brasileiro Cao (Seu Jorge), entre outros. Cris é recebido com estranhamento, pois, ao contrário dos outros, não é cientista. Há uma contraposição entre os propósitos dos pesquisadores e do artista – um embate que o filme ensaia.
Escrito e dirigido por uma dupla que atende pelo nome de 300 ml – vindos da propaganda e responsáveis pelo curta Tarantino’s Mind (que traz Selton e Seu Jorge no elenco) –, Soundtrack é um filme estranho, que recusa classificações fáceis, mas, ao fundo, com seu esmero técnico, talvez seja um tanto egocêntrico como seu protagonista. Uma exposição apenas de selfies? É sério isso? É óbvio que o nome mais refinado é autorretrato, mas a volatilidade do mundo contemporâneo pede algo mais global com nome em inglês.
Cris enfrenta diversos problemas, como de adaptação e uma certa hostilidade de seus colegas de estação. Mas, no fundo, ele não parece estar se importando muito com isso. Ele quer apenas solidão e um cenário inusitado – e um tanto inóspito – para fazer aflorar uma experiência sensorial que, supostamente, será captada por sua câmera.
Ele é aconselhado, entre outras coisas, a não se distanciar muito da base e sempre carregar colado ao seu corpo seu rádio de comunicação. É o tipo de coisa, em filme, que se sabe que os personagens farão exatamente o contrário, criando alguma situação dramática, quando ele ficar perdido na neve e sem o rádio.
O exercício da misteriosa dupla de diretores nesse estudo de personagem consiste em manter por quase duas horas o óbvio em suspenso. Cris está numa viagem espiritual de autodescoberta – mas sabemos pouco sobre ele. Uma pequena cena em flashback não diz muito. Quem é ele e por que se quer se isolar são perguntas que o filme não responde. Portanto, é de se pensar até que ponto essa jornada do personagem – e a investigação dela – surte algum efeito. Repleto de boas intenções e tecnicamente competente – com fotografia assinada por Felipe Reinheimer –, Soundtrack é um filme excêntrico, como seus personagens, e um tanto frio, tal qual o cenário que eles habitam.