12/09/2024
Drama

Quando Hitler roubou o coelho cor-de-rosa

Filha de um famoso intelectual judeu, a pequena Anna vê sua vida mudar radicalmente quando sua família é obrigada a deixar Berlim quando Hitler sobe ao poder, em 1933.

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A presença de um coelho no título talvez possa remeter a outro filme recente sobre a Alemanha nazista pelo olhar de uma criança, Jojo Rabbit, mas, para a sorte de Quando Hitler roubou o coelho cor-de-rosa, os dois longas não podiam ser mais diferentes. O tom acelerado e pop do filme americano dá lugar algo mais meditativo e menos histérico da produção alemã, dirigida por Carolina Link, ganhadora do Oscar de melhor filme estrangeiro em 2003 por Lugar nenhum na África.
 
O roteiro, assinado pela diretora e Anna Brüggemann, parte do livro infanto-juvenil homônimo de Judith Kerr, premiada escritora e ilustradora alemã. Ela, por sua vez, inspirou-se em episódios de sua infância, quando sua família teve de deixar Berlim na iminência da eleição de Hitler, em 1933, uma vez que seu pai, Arthur Kemper (Oliver Masucci), além de ferrenho opositor ao candidato, era judeu.
 
Quando Hitler roubou o coelho cor-de-rosa ameaça, em seu começo, ser mais um daqueles filmes que narram uma história de horror pelos olhos de uma criança que, aos poucos, perde sua inocência. Mas Link, valendo-se das memórias da autora, evita esse tipo de armadilha ao estabelecer logo de cara um tom de perplexidade de nostalgia. E, também, ao evitar horrores explícitos da guerra e do Holocausto, foge de qualquer sensacionalismo que poderia recair no filme.
 
Em Riva Krymalowski, como a protagonista Anna, o longa encontra uma jovem grande atriz, cuja melancolia e saudade de casa dão o tom. Garota estudiosa, a menina ressente-se de abandonar sua escola e amigos. Quando faz as malas, não consegue se decidir se deve levar seu velho coelho cor-de-rosa de pelúcia ou um novo cachorrinho que ganhou há pouco tempo. Levar um significa abandonar o outro, e vice-versa. Ela toma uma opção estoica: deixa os dois brinquedos, além da empregada que a conhece desde o nascimento, Heimpi (Ursula Werner).
 
Ao lado da mãe, Dorothea (Carla Juri), e do irmão um pouco mais velho, Max (Marinus Hohmann), Anna viaja de trem para a Suíça, onde o pai espera pela família. O fundo histórico político do momento é dado de maneira discreta, novamente, filtrado pela sensibilidade da garota. Ela ouve a mãe falando ao telefone sobre o destino daqueles que continuaram na Alemanha, não raro, com destinos trágicos.
 
O brinquedo do título, na verdade, é uma metáfora sobre a perda da inocência, daquilo que fica para trás quando se é obrigado a fugir de seu próprio lar. A maneira como os temas são abordados torna-os acessíveis a crianças maiores – na mesma faixa etária à qual o livro se destina. Além disso, o longa faz um paralelo, embora não explícito, com o presente: a posição de Anna e sua família não é muito diferente da dos milhares de refugiados e refugiadas obrigadas a abandonarem seus lares em busca de uma vida mais segura em outras terras.
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