Nos últimos anos, a expressão Cha cha real smooth talvez tenha ficado conhecida por causa do meme com o dinossauro magenta Barney, que aparece numa versão tosca, com os braços abertos e cara de “e agora?” – embora venha, originalmente, de uma música do ano 2000. Cha cha real smooth – O próximo passo, escrito, dirigido e protagonizado por Cooper Raiff, tem tudo para reivindicar a expressão para si. A ideia do meme, que está muito próxima do filme, é, basicamente, o desconforto.
Andrew (Raiff) tem 20 e poucos anos, recentemente terminou a faculdade e e está sem rumo na vida. Trabalha numa rede de fast food e voltou a morar com a mãe (Leslie Mann, roubando a cena) e com o padrasto (Brad Garrett), com quem não se dá bem, e com o irmão caçula, David (Evan Assante). Um dia, num bar-mitzvá, ele descobre um talento: animar festas, colocar as pessoas para dançar, deixar todo mundo contente. E, quase que ao acaso, transforma esses talentos numa profissão.
Nessa mesma festa, ele conhece Domino (Dakota Johnson) e sua filha Lola (Vanessa Burghardt), que é autista, e prefere ficar o tempo todo sentada brincando com um cubo mágico a dançar na festa. Mas Andrew consegue o improvável: fazer a menina dançar. E assim começa uma amizade entre eles. Há uma história no passado do protagonista, mostrada no prólogo do filme: quando criança, aos 12 anos, ele se declarou com todo seu coração a uma animadora de festas mais velha. A moça ficou lisonjeada, mas disse que nada poderia acontecer entre eles, por conta da diferença de idade.
Aparentemente, nesse momento estabeleceu-se um padrão: Andrew gostar de mulheres mais velhas – e o fato de passar a trabalhar também como animador de festas é só um toque um tanto irônico e simbólico em sua trajetória. Obviamente, ele irá se apaixonar por Domino, que também parece viver uma vida de incertezas. Ela mora com um advogado, Joseph (Raúl Castillo), com quem pretende se casar, mas também não resiste aos avanços de Andrew.
Cha cha real smooth é, essencialmente, a típica produção indie americana, e o fato de ganhar o prêmio de público no Festival de Sundance deste ano não é nenhuma surpresa. Mas o que importa mesmo é: o filme tem o coração no lugar. Seus personagens são extremamente humanos, apesar de flertarem com os clichês. Acompanhamos aqui as dores do crescimento (possivelmente um tanto tardio) do protagonista em seu processo de descobrir o que fazer com sua vida.
Raiff, que fez sucesso no SXSW em 2020, com Shithouse, levando o prêmio principal no festival, coloca-se numa posição delicada. Seu filme é, ao mesmo tempo, um amálgama de elementos do cinema americano independente, mas também está envolvido num frescor pelo seu olhar tão generoso e carinhoso por seus personagens – ajuda o fato de Dakota Johnson ser a atriz ideal para o papel: forte, mas também frágil.
Cha cha real smooth pode não ser um longa perfeito – e pouquíssimos o são. Mas, numa época em que filmes parecem cada vez mais feitos por algoritmos, este tem emoção e sentimento para se conectar com o público, sem precisar recorrer a estratagemas baratos.