07/09/2024

Robin é uma atriz de 44 anos, que viveu o sucesso instantâneo quando bem jovem. Mas, depois de algumas escolhas erradas e recusas de papeis, sua carreira estagnou. Agora, ela só pensa em cuidar dos filhos, mas para isso precisa de dinheiro. O estúdio a que está ligada por contrato faz uma estranha proposta: que em troca de uma alta soma ela aceite ter sua imagem digitalizada. A partir daí, o estúdio é dono de sua imagem e pode usá-la como quiser.

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O diretor israelense Ari Folman costuma levar a animação a territórios inesperados. Como a política, com Valsa com Bashir (2008), um criativo semidocumentário que discutia a invasão israelense do Líbano, em 1982. Seu mais recente trabalho, O Congresso Futurista, mistura animação e live action para não só adaptar o livro O Congresso Futurológico (1971), do polonês Stanislaw Lem (1921-2006), como para encenar uma corrosiva análise da máquina de entretenimento de Hollywood e nosso tempo obcecado pela celebridade.
 
A obra do inspirado Lem (autor também de Solaris, que rendeu duas versões cinematográficas), é verdade, fornece um amplo ponto de partida, sendo precursora, em mais de duas décadas, de um conceito de realidade virtual reapropriado, em outra chave, pelo sucesso Matrix (1999), dos irmãos Andy e Lana Wachowski.
 
O filme começa em live action. Robin Wright (fazendo o próprio papel) é uma atriz de 44 anos, que teve sucesso na adolescência, mas depois enterrou sua carreira em escolhas erradas e crises emocionais. Hoje, ela vive numa casa modesta, com os filhos Sarah (Sami Gayle) e Aaron (Kodi Smit McPhee) – este último, exigindo cuidados de saúde.
 
Robin está num impasse existencial, precisando de dinheiro, mas com a imagem queimada junto aos produtores. Seu agente, Al (Harvey Keitel), procura-a com uma proposta que, diz ele, será a última feita pelo estúdio que detém contrato com a atriz, o Miramount – qualquer semelhança com nomes reais de estúdios não será mera coincidência.
 
A proposta do produtor Jeff (Danny Huston) é que a atriz aceite ter sua imagem escaneada e estocada num chip, que passará a ser propriedade do estúdio e que poderá ser usada em todo e qualquer gênero de filme, sem que ela tenha controle sobre isso. A atriz deverá, então, a troco de uma alta soma, assinar um contrato abrindo mão de usar a própria imagem por 20 anos.
 
Robin hesita, mas afinal aceita, porque é alto o custo do tratamento do filho. Ela também não tem mais qualquer ilusão ou objetivo com a carreira. Vinte anos depois, quando sua versão digital já estrelou de ficções científicas a filmes de ação, é convidada a participar de um congresso da empresa, que agora se chama Miramount-Nagasaki.
Para participar desse congresso, todos os convidados devem ingerir uma ampola que os coloca num mundo virtual, em que todos se enxergam como animações. A partir daí, o filme se transforma num desenho animado.
 
A visão de futuro contida neste segmento é das mais sombrias. Na realidade, o mundo fora dali não é nada digno de ser contemplado. Toda possibilidade de utopia e felicidade é essa ilusão virtual, mantida quimicamente.
Alguns toques de humor surgem nas versões animadas de alguns personagens famosos, como um Tom Cruise de traços orientais e um Michael Jackson fazendo as vezes de garçom num restaurante de luxo.
 
De modo geral, O Congresso Futurista é bastante complexo. Ambicioso também. Não à toa, Robin Wright, uma das produtoras, está muito à vontade num papel que tem declarados pontos de contato com a própria biografia e lhe dá oportunidades extraordinárias de demonstrar a versatilidade de seu talento, nem sempre bem aproveitado ao longo de sua carreira.
 
No quesito visual, a animação é de uma riqueza e ousadia consistentes, embora lhe falte algum ritmo no cômputo geral do filme. 
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