Em seu longa de estreia, o diretor sérvio Rasko Miljkovic acerta na sutileza para conduzir uma história envolvendo crianças, deficiência, bullying e fantasia – melhor ainda, sem apelar para a pieguice.
Exibido na Mostra Internacional de S. Paulo, o filme tem como protagonista Jovan (Mihajlo Milavic), garoto de 10 anos que luta contra os efeitos de uma paralisia cerebral parcial. O problema limita seus movimentos, complicando sua locomoção. Por conta disso, seu cotidiano inclui exaustivas sessões de fisioterapia. Na escola, ele é alvo preferencial dos valentões, contra os quais pouco pode fazer. Ele se refugia na fantasia, em que assume a identidade de Shade, um super-herói voador, de roupa azul brilhante e capaz de vencer todos os obstáculos que o amarram na vida real.
Bem-cuidado por pais atentos (Jelena Dokic e Bojan Zirovic), ele na verdade tem poucos amigos. Isto muda no dia em que chega à escola uma nova aluna, Milica (Silma Mahmuti) que, como Jovan, não se encaixa num perfil tradicional. Longe de ser uma menininha delicada, ela é valente e enfrenta os bullies na mesma moeda. Rapidamente, ela e Jovan formam uma dupla inseparável.
No momento, o drama de Milica é a separação dos pais, o que a levou, junto com a mãe, a morar na casa da avó. O pai ficou no apartamento onde morava junto com uma nova namorada. Como Milica acredita que o amor só acontece de verdade uma vez na vida, ela está convencida de que o pai foi enfeitiçado pela nova mulher.
Para ajudar sua amiga, Jovan desenvolve um plano mirabolante: os dois vão invadir, à noite, o apartamento do pai dela e localizar as poções com ervas com que a menina acredita que o pai está sendo controlado. A expedição é o centro do filme, que conta com efeitos especiais bastante decentes para retratar o universo imaginário de Jovan na pele de Shade.
Indicado para plateias infanto-juvenis, Shade – entre bruxas e heróis acerta pela simplicidade de sua formulação. O diretor não inventa demais nem vai além do que seria cabível no universo de duas crianças de 10 anos. Também não força a barra na exposição das limitações físicas do protagonista, sem escamotear suas dificuldades. Com esta atitude, não ofende a inteligência de ninguém e proporciona momentos honestos de diversão, inclusive à plateia adulta que acompanhar a garotada na sessão.
