08/09/2024
Drama

Swallow

Hunter Conrad tem uma vida aparentemente feliz, com um marido apaixonado e bem posicionado. Ela, no entanto, desenvolve a compulsão de engolir objetos. À medida em que o tempo passa, ela precisa confrontar o seus traumas do passado.

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A protagonista começa a expressar sua aflitiva compulsão por engolir coisas com uma pequena fubeca – logo expelida – até objetos ainda mais perigosos, como uma pilha e alfinetes. É, de certa forma, a metáfora que o diretor Carlo Mirabella-Davis usa para que sua personagem, Hunter (interpretada com brio e coragem por Haley Bennett, premiada no Festival de Tribeca), enfrente o patriarcado.
 
O filme começa com o noivado dela com Richie (Austin Stowell), playboy arrogante que subiu na vida cuidando das empresas do pai. Eles são um casal perfeito: lindos, felizes e morando numa casa invejável. O figurino de Hunter, não por acaso, lembra roupas dos anos de 1950, quando o padrão imposto às mulheres era tornarem-se donas de casa (até o aspirador de pó dela é retrô). Entediada, a protagonista tenta achar formas de passar o tempo, até que engravida.
 
A primeira manifestação de seu transtorno é quase banal. Durante um jantar, ela conta uma história, quando é interrompida e ninguém mais a ouve. O gelo, ali no copo, tão convidativo, é sedutor. Ela devora, de maneira banal, uma pedra de gelo. Depois começa a compulsão por outros objetos. A descoberta dessa compulsão é por acaso, durante um ultrassom.
 
A partir daí, a vida de Hunter se torna um inferno. Engolir objetos foi a forma de retomar posse de seu próprio corpo mas, quando o distúrbio é diagnosticado, seu corpo deixa completamente de ser seu: ela é medicada, tratada, vigiada por um enfermeiro (Laith Nakli) – tudo para protegê-la dela mesma. O que há por trás da fachada envernizada da família – que inclui o casal de sogros (David Rasche e Elizabeth Marvel) – é a opressão que obriga a protagonista a fazer o jogo das aparências.
 
É bem verdade que Mirabella-Davis, também autor do roteiro, simplifica questões psicológicas do transtorno e também força nas explicações (nem tudo é tão direto como ele coloca), mas a função disso é por um bem maior: investigar a dinâmica dos papéis de gênero na sociedade contemporânea. Hunter é a esposa-modelo, com figurino e maquiagem impecáveis, até um jeitinho meio infantil e submisso de falar, que vai sendo abandonado na medida em que toma posse de si mesma.
 
O filme chega perto da sátira, mas é no suspense que o diretor finca o pé, resultando em momentos aflitivos e angustiantes. A jornada de Hunter não teria como ser de outro jeito, e, a cada passo, é um elo da corrente de opressão que vai sendo quebrado. Os momentos finais são corajosos, apontando para novas possibilidades – não apenas para Hunter, mas para todas as novas gerações de mulheres, cada vez mais conscientes de (e lutando por) seus direitos.
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