18/03/2025
Terror Fantasia

Sandman

Depois de passar anos aprisionado por um mago, Morpheus, também conhecido como Sonho e Sandman, precisa reconstruir seu mundo e tomar de volta aquilo que lhe foi roubado.

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Foram necessárias três décadas para que a série de quadrinhos The Sandman, de Neil Gaiman, chegasse à mídia audiovisual. Várias tentativas foram feitas para uma transposição para o cinema, mas a obra é gigantesca e esapalhafatosa demais para um filme de 2 ou 3 horas. Foi apenas com a ascensão das séries como formato que os livros encontraram uma maneira de serem adaptados na série Sandman.
 
Tendo o próprio autor creditado como um dos criadores – os outros dois são David S. Goyer e Allan Heinberg –, a série da Netflix é absolutamente fiel ao original – para o bem e para o mal. O visual é impressionante – embora em alguns momentos remeta a Americans Gods, outra série baseada em Gaiman –, e traduz em imagens sem economia a complexidade e o deslumbre estético do original. A ideia é, ao mesmo tempo, agradar fãs dos quadrinhos, mas também não alienar quem os desconhece e, nesse sentido, a série se sai bem na maior parte do tempo.
 
Sandman, também conhecido como Sonho, Morpheus, entre outros nomes, é interpretado por Tom Sturridge, com uma voz grave e um visual emo-cool marcante. A narrativa começa nos primórdios do século XX, com o protagonista erroneamente sequestrado por um mago, Roderick Burgess (Charles Dance), que achava ter capturado sua irmã, Morte (Kirby Howell-Baptiste), para, num ritual, trazer de volta seu filho morto na guerra.
 
Após a fuga, a missão de Sandman é reconstruir seu reino. A partir daí, em 10 episódios, variando entre 37 minutos e pouco mais de 50, Sandman é a história dessa reconstrução, tomando alguns desvios no meio do caminho, como por exemplo, um episódio excepcional, que se passa quase que na íntegra dentro de um restaurante, protagonizando por um personagem secundário, John Dee (David Thewlis), que possui um amuleto com o dom de fazer as pessoas dizerem apenas a verdade. Suas intenções são boas, mas o resultado é desastroso.
 
Vários personagens coadjuvantes, como Dee, terão algum momento de protagonismo com ou sem Sandman ao seu lado. A Morte, acompanhada do irmão, mostra seu modus operandi, que, ao contrário da ideia corrente, é suave e doce, e, para ela, muitas vezes, também doloroso. Constantine – que já foi protagonista de um filme com Keanu Reeves no papel – é interpretado com sagacidade e inteligência por Jenna Coleman, e conquistou tanto o público que já há rumores de que ganhará uma série só sua.
 
Outra personagem que ganha destaque na segunda metade da série é Rose Walker (Vanesu Samunyai), que ao lado de uma amiga, Lyta (Razane Jammal), cai numa espécie de fenda no tempo cósmica que dá poderes a Sandman. É uma subtrama que, embora longa, nem sempre parece funcionar direito, colocando o protagonista de lado por um bom tempo e se repetindo em temas e motivos.
 
Por outro lado, um grande ganho na adaptação de Sandman é sua capacidade em incorporar ao elenco de personagens atores e atrizes negros e negras, pessoas não-binárias, num mundo que, originariamente, nos quadrinhos, era massivamente dominado por homens brancos. É, ao mesmo tempo, reflexo da contemporaneidade e uma jogada de mercado esperta da Netflix e dos criadores da série – sem prejuízo do fato de que a ideia inclusiva é excelente, especialmente porque vários e várias dessas personagens ganham destaque.
 
Ao ser fiel demais ao original, talvez Sandman furte-se de se reinventar para uma nova mídia. A beleza visual, assim como o tempo da narrativa desapressada, é surpreendente, mas raramente a transposição de uma mídia para outra deve ser automática. Era necessário se apropriar dos quadrinhos e os abandonar depois. E a  culpa certamente não é de Gaiman que, várias vezes, já deu provas de ser desapegado à ideia de que as adaptações de suas obras devam ser fieis.
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