21/05/2024
Comédia dramática

As histórias de meu pai

Aos olhos do pequeno Émile, seu pai é um herói. O garoto não percebe que com suas histórias megalômanas e radicalismo político de extrema-direita, o homem trata-o de forma abusiva. Assim, o menino se torna o cúmplice ideal nos planos mirabolantes do pai.

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O francês As histórias de meu pai é fofo, contando sobre um homem megalomaníaco e as mentiras (boa parte políticas) que conta ao seu filho pequeno. É tudo meio engraçadinho – não fosse um problema central: é um filme sobre paternidade abusiva e, como tal, não deveria exatamente ser lúdico ou divertido. Essa é uma dissonância complicada no longa de Jean-Pierre Améris.
 
André Choulans (Benoît Poelvoorde) é o pai do título, um homem politica, social e pessoalmente míope, incapaz de enxergar para além de seus interesses. Nesse sentido, o filho, Émile (Jules Lefebvre), e a mulher, Denise (Audrey Dana), são quem sofre as consequências, especialmente em forma de abusos verbais, emocionais e até físicos. Um dia em que ela, por exemplo, vai a um concerto à noite, ele não a deixa entrar no apartamento, obrigando-a a passar a noite no corredor, e bate no filho quando ele tenta intervir em favor da mãe.
 
O filme, que parte de um romance de Sorj Chalandon, toma como ponto de vista da narrativa o olhar do pequeno Émile, que tudo vê sem compreender direito, e tem no pai uma espécie de herói. Não é exatamente essa a questão: o problema do filme está em aderir completamente a esse olhar infantil e sem experiência, tornando tudo meio lúdico e engraçadinho.
 
André conta ao filho da existência de uma organização terrorista secreta de extra-direita, a OAS - Organisation Armée Secrète. E manda o garoto em “missões” secretas, que, obviamente, para ele são meras aventuras e diversão, sem saber do perigo que envolvem esses atos. É quase uma lavagem cerebral na cabeça de Émile.
 
Améris se concentra no olhar infantil que, por muito tempo, nada questiona e é tão vítima quanto as vítimas dos atos terroristas. O pai covarde, que se esconde em casa e manda o menino se arriscar, é uma espécie de herói para a criança. Na reta final, o filme tenta entrar nos eixos, mas aí já é tarde demais. De certa forma estranha, As histórias de meu pai ressoa no Brasil contemporâneo, quando crianças são levadas por pais e pessoas responsáveis a atos políticos sem terem a noção exatamente do que está acontecendo.
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