Lírio Ferreira e Natara Ney assinam, neste documentário, um registro impressionista da trajetória de Cafi, apelido pelo qual ficou conhecido o fotógrafo pernambucano radicado no Rio Carlos da Silva Assunção Filho (1950-2019).
O próprio Cafi se insere em cena, andando por diversos cenários, sempre com seus fones de ouvido a postos, numa amostra de como ele caminhava pelo mundo, captando, com seu olhar, pessoas e objetos que registrava com sua câmera inquieta. Assim registrou pioneiramente o maracatu e blocos de Carnaval de rua de Olinda, imagens em que experimenta uma perícia que se tornaria mais conhecida por seu trabalho em capas de discos antológicas de alguns dos maiores artistas da música popular brasileira: Alceu Valença, Macalé, Turíbio Santos e toda a turma do Clube da Esquina, da qual ele foi uma espécie de “fotógrafo oficial”.
Um bom recurso é o documentário ouvir alguns desses artistas, como Alceu, Macalé e Lô Borges, que oferecem histórias saborosas da criação destas capas e também de sua convivência com o fotógrafo - que dizia que “tudo o que se faz na vida é para ser amado e se comunicar com o outro”.
Cafi, certamente, fazia desta comunicação a pedra fundamental de sua parceria com os artistas na ilustração de suas obras - como as fotos do galpão que constituiu o cenário da peça Os Sertões, na versão de José Celso Martinez Corrêa, com quem Cafi mantém uma das conversas mais interessantes do filme, assim como com sua ex-mulher, a coreógrafa Débora Colker, com quem teve dois filhos.
Também colecionava frases este fotógrafo, que colhe justamente de "Os Sertões", de Euclides da Cunha, esta que lhe ficou na memória: “O martírio do homem é o martírio da terra”. E não poucas fotos de Cafi captaram este martírio de forma dramática.
Agudo observador da vida e da arte brasileiras, Cafi registrou com sua câmera momentos decisivos de vários movimentos culturais de nosso tempo, como o Nuvem Cigana, bem como as origens do Circo Voador e da trupe Asdrúbal Trouxe o Trombone. Contemporâneo de todas essas manifestações da cultura brasileira, Cafi fez jus ao pertencimento a um clã artístico, que lhe vinha por parte da mãe, Maria Clara Rodrigues, irmã do artista plástico Augusto Rodrigues e prima do dramaturgo Nelson Rodrigues. Deixou sua marca, um acervo formidável e muita saudade.