Premiado em Cannes e no Festival do Rio, Levante é um filme que pulsa com a energia de sua protagonista, Sofia interpretada com garra e sagacidade por Ayomi Domenica. Escrito e dirigido pela estreante em longa Lillah Halla, o filme tira do duplo sentido de seu título seu mote: a ação de levantar a bola no vôlei que as personagens praticam, e na ação de uma amiga levantar a outra nos momentos de maior dificuldade.
O retrato de jovens de uma comunidade periférica que encontra na companhia mútua a força para seguir em frente e encarar as adversidades juntas é feito com paixão e força real com a direção precisa de Halla, premiada no Festival do Rio. A fotografia de Wilssa Esser transita entre o realismo e algo de fantasia que se torna necessária nos momentos de maior pressão para que as personagens enfrentem a vida.
Sofia é destaque no time de vôlei, sob o comando de Sol (Grace Passô), sua performance a coloca na disputa por uma bolsa de estudos para jogar em outro país. O protagonismo dessa personagem, mulher, periférica e negra, já coloca o filme em outro patamar, mas isso não seria o suficiente se a criação de Halla, que assina o roteiro com María Elena Morán, não desse à protagonista capacidade de agência.
A diversidade, de corpos e visões de mundo, entre as jovens personagens é celebrada por Levante que encontra nelas a mesma diversidade do mundo contemporâneo. Mas, não se engane, o filme não é ingênuo. Há um ponto de virada na vida dessa garota que a colocará numa posição de escolha, e, novamente, o filme dá a Sofia a possibilidade de agir.
Quando a protagonista se descobre grávida, ela precisa tomar uma decisão. Seguir em frente com a gravidez e perder a bolsa de estudos, ou interromper e se mudar para outro país. Nesse momento, porém, Levante se torna ainda mais áspero: a socidade em que Sofia vive, como sabemos, é machista e violenta. Tomando sempre o ponto de vista dessa personagem, o filme acompanha seu calvário de opressão.
Halla não nos poupa, não toma caminhos que desviem o conflito. O mundo é cruel, e o filme vai mostrar isso sem piedade mesmo. Se todos os dias mulheres têm de encarar essa opressão e violência do machismo e do patriarcado, porque desviar disso na tela? Ainda assim, a cineasta encontra possibilidades de uma utopia, de um sopro de esperança – mesmo que seja ainda apenas na tela, já que no mundo real temos um longo caminho para percorrer.