Schotté empresta seu olhar sofrido ao protagonista deste novo drama ambientado na cidade de Bailleul, norte da França, onde foi filmado o primeiro longa de Dumont. Como naquele trabalho, o bucolismo da paisagem e a tranqüilidade das pessoas não passam de aparência. Pharaon de Winter, por exemplo, descende de uma linhagem de artistas. Seu nome, que é o mesmo da rua onde mora, veio do bisavô, um pintor consagrado cuja obra é acervo de museus. Mas a vida desta geração da família não guarda mais nenhum glamour. O atual Pharaon é um policial tímido que se horroriza diante da visão do cadáver violado de uma menina de 11 anos.
O encontro desse cadáver, cujo sexo é exposto sem rodeios pela câmera indiscreta de Dumont, deflagra a história, que gira no mesmo ritmo desesperadamente lento de uma vida cotidiana em que as pessoas perderam a capacidade de importar-se com a morte de uma criança. Nessa vida dessensibilizada, a derradeira conexão entre as pessoas reside num sexo um tanto rude, como o praticado por Domino e Joseph, que às vezes o vizinho policial espia. Da praia local, enxerga-se a Inglaterra do outro lado do oceano. Mas ninguém parece lembrar que navegar é possível.