17/04/2025
Suspense Drama

Caché

Georges é um bem-sucedido apresentador de programa literário na TV. Um dia, passa a receber fitas de vídeo que mostram que alguém o está espionando. Nos dias seguintes, enviam-lhe também desenhos ameaçadores. A segurança familiar fica abalada. Georges procura explicações em seu passado.

post-ex_7

Há sempre um componente de surpresa a cada novo trabalho do diretor austríaco Michael Haneke – o que o torna um dos cineastas mais interessantes do cinema atual. Neste filme, pelo qual venceu o troféu de melhor diretor no Festival de Cannes em 2005, Haneke encena mais uma vez um drama centrado no mal-estar da classe média. O protagonista é Georges (Daniel Auteuil), bem-sucedido apresentador de um programa literário na TV. Ele mora numa casa confortável, tem carro do ano, sua mulher, Anne (Juliette Binoche), é uma editora de sucesso e seu filho adolescente, Pierre (Daniel Duval) não vive maiores dilemas.

Toda esta capa de segurança é abalada pela chegada de vídeos, que mostram que a família está sendo filmada. A consciência de que há um estranho interessado em espioná-los e a própria chegada dos vídeos, entregues sem carimbo do correio, bastam para desencadear um processo gradativo de inquietação e neurose na vida da família.

Ninguém melhor do que Haneke para explorar este desconforto levado às quase últimas conseqüências. O diretor austríaco, autor de Código Desconhecido e Violência Gratuita, esmera-se nesta exposição de uma ferida que não está exposta, sempre escondida (o que remete ao título do filme, “escondido”, em francês), porque se tenta evitar olhá-la de frente – o que só contribui para que ela se alastre num irresistível câncer social, que semeia o medo e o rancor, sem abrir possibilidades de cura e redenção.

É inegável que há intenções políticas por trás do filme, que pode ser lido como uma aguda reflexão sobre o choque racial e social que hoje abala a França, país com grande percentual de imigrantes de todas as origens. Ao falar da dificuldade do personagem central de assumir culpas passadas – em relação a um argelino (Maurice Bénichou) – e presentes (como demonstra seu descontrole no quase confronto com o ciclista afrodescendente), a narrativa esclarece o modo de preparo do caldo de ódio permanente, capaz unicamente de gerar tragédias.

O final do filme é, aparentemente, simples – mas na verdade muito misterioso. É otimista ou pessimista ? Sugere o apaziguamento do conflito ou projeta sua continuidade para as próximas gerações ? Ver mais de uma vez o filme parece abrir sempre novas possibilidades de interpretação, ao invés de fechá-las, o que é mérito de um diretor no auge da forma.

Falando em auge, a densidade e qualidade de emoção que Juliette Binoche é capaz de projetar num simples olhar é dessas coisas que só uma câmera muito sensível pode captar. Que atriz magnífica na maturidade é a bela Juliette e sua melancolia poética essencial.

post