08/02/2025
Fantasia

A Dama na Água

O zelador de um complexo de prédios, Cleveland (Paul Giamatti), encontra numa piscina uma espécie de ninfa (Bryce Dallas Howard) que veio parar no mundo real. Para que ela retorne ao seu universo será preciso um ritual.

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A fantasia A Dama na Água deve ser a vingança pessoal do diretor indiano radicado nos EUA M. Night Shyamalan contra os críticos e público que lhe deram as costas no seu filme anterior, A Vila (04). Aqui, inclusive há um personagem crítico de cinema e literatura que por força da profissão diz ser capaz de saber o final dos filmes e livros que analisa. Há inclusive um diálogo patético, em que alguns personagens comentam como alguém pode ser tão arrogante a ponto de julgar o trabalho de outra pessoa. Falando em arrogância, depois de pequenas participações à la Hitchcock em seus filmes, aqui o diretor assume um dos papéis centrais, como um escritor cuja obra irá mudar o mundo, segundo uma previsão feita por um ser fantástico.

Menos arrogante e bem mais talentoso é Paul Giamatti, aqui no papel de um zelador melancólico que encontra uma espécie de ninfa na piscina do complexo de apartamentos onde mora e trabalha. Com seu olhar triste e seu talento para nuances da comédia ao drama, o ator é capaz de convencer qualquer público. Pena o roteiro não estar à altura. O ser mágico é interpretado por Bryce Dallas Howard, que também é capaz de bem mais do que ficar desidratada e pálida o tempo todo – como está aqui.

A criatura, na verdade, é chamada de narf, e tem as horas contadas para achar um meio de voltar para o seu mundo. A razão disso nunca fica clara, nem mesmo com a animação desnecessária que abre o filme, contando que humanos e seres da água conviviam em harmonia até uma guerra, ou qualquer coisa assim, saída da cabeça criativa, mas mal resolvida, de Shyamalan.

Como ele chama o filme de "fábula", o diretor e roteirista parece se legitimar a não buscar muito nexo. Ninguém, aliás, cobra veracidade de uma fantasia. Mas se Shyamalan parece querer misturar o mundano e o mágico/sobrenatural em seus filmes, aqui esse casamento nunca acontece. Ele tenta uma história à moda de E.T – O Extraterrestre, mas a personagem ninfa nunca é capaz de despertar mais do que uma mera indiferença, ao contrário do pequeno alienígena de Spielberg. A Dama na Água soa ainda mais desnecessário se pensado que o cinema já se aventurou pela fantasia com resultados muito mais sofisticados, ao adaptar O Senhor dos Anéis, de Tolkien, e As Crônicas de Nárnia, de C.S. Lewis. Essas são obras capazes de criar e se apoiar numa mitologia própria, fazendo um mundo de fantasia totalmente palpável e crível.

Com suas filosofadas neo-new age, Shyamalan prega algo tão hipócrita como a passividade e o conformismo. A certa altura um personagem diz que as pessoas devem fazer o papel que lhes cabe, não aquele que desejam. É o mesmo que dizer: não corra atrás de seu sonhos porque, se não for seu destino, de nada vai adiantar. Ou ainda, não tente mudar o mundo, é impossível. Cada fala de um personagem parece ser carregada com Gotas de Sabedoria – destinadas aos menos iluminados do que ele, ou seja, o resto da humanidade.

Já o crítico de cinema do filme (Bob Balaban) é uma espécie de vingança que saiu pela culatra. Ele é o personagem mais divertido, digno e, de longe, o mais inteligente do longa. Certamente um jornalista honesto que faria uma crítica sincera sobre esse filme, dizendo que é pura perda de tempo e energia. O mesmo é válido para o livro que o personagem de Shyamalan estava escrevendo.

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