Sete histórias ambientadas em Havana, Cuba, nos dias de hoje. Uma jovem cantora fica tentada a abandonar seu namorado atleta perseguindo o sonho de uma carreira no exterior. Um casal maduro completa o orçamento fazendo doces para fora. Uma mãe de santo sonha com a Virgem Maria e convoca os esforços de toda uma comunidade para uma oferenda. Um cineasta estrangeiro foge de uma homenagem para mergulhar na música cubana. Outro cineasta, palestino, descobre as belezas e contradições da ilha, enquanto espera uma audiência com Fidel Castro.
- Por Neusa Barbosa
- 24/10/2012
- Tempo de leitura 3 minutos
Projetos cinematográficos coletivos são sempre boas oportunidades de associar visões diferentes, mas também um risco de disparidade entre suas partes. É isso o que acontece em 7 Dias em Havana, uma coprodução entre Cuba, França e Espanha que reuniu sete diretores, apenas um deles cubano, para criar histórias ambientadas em Havana. O filme foi exibido na mostra Un Certain Regard, de Cannes 2012.
Com crise econômica, social e política ou não, Cuba respira vida, dinamismo, jeitinhos, boa música, beleza e sensualidade. Assim, fica difícil entender porque tantas destas histórias optaram por clichês fáceis sobre a latinidade, do mesmo tipo que costumam atingir o Brasil em alguns filmes feitos por estrangeiros, ou seja, a velha e nada boa “macumba pra turista”.
Dos sete segmentos, de longe o melhor é Jam Session, assinado pelo argentino Pablo Trapero (Abutres),que faz bom uso do talento do diretor sérvio Emir Kusturica como ator. Ele interpreta a si mesmo numa chave bem exagerada, como o cineasta homenageado num Festival de Havana que desembarca na ilha em plena crise matrimonial. Por conta disso, bebe sem parar e dá o maior trabalho às pessoas que cuidam dele, tornando um inferno a vida de seu motorista, Alexander (Alexander Abreu).
Com jogo de cintura, Alexander ajuda Kusturica a escapar de um banquete oficial, aceitando sua companhia para a jam session a que se dirige – e que, apesar do cenário empobrecido, num fundo de quintal frequentado inclusive por galinhas, não esconde a alta qualidade da música. Alexander, aliás, é um refinado trompetista e compositor na vida real.
Na história de Trapero infiltra-se um drama comum a tantos cubanos, o sonho de escapar para uma vida menos dura no exterior, e que é tema de outro episódio, Doce-amargo, do cubano Juan Carlos Tabío (Morango e Chocolate). Os protagonistas são um casal, interpretado pelos veteranos Jorge Perugorría e Mirta Ibarra. Ele, aposentado, ela, psicóloga e reforçando o minguado orçamento familiar com seus doces, para cuja confecção convoca os esforços do marido. Mas sua filha mais velha, Cecilia (Melvis Estevez), já cansou de Cuba – agora prepara-se para fugir para Miami numa precária balsa.
Cecilia, aliás, é a protagonista da história dirigida pelo espanhol Julio Medem, A Tentação de Cecilia – em que a moça, uma bela e talentosa cantora de cabaré, recebe uma proposta tentadora de partir para a Europa, feita por um jovem empresário alemão (Daniel Brühl), que não esconde também sua paixão por ela.
A Fonte, do francês Laurent Cantet, acompanha o esforço insano de uma comunidade para atender a uma mãe de santo, que sonhou que teria que ser construída uma fonte no meio de sua sala, em homenagem à Virgem Maria – como o Brasil, Cuba é pródiga no sincretismo religioso.
El Yuma, do também ator Benicio Del Toro, explora alguns dos quase sempre divertidos mal-entendidos envolvendo os cubanos e os norte-americanos, a partir da visita de um ator e futuro estudante de cinema na ilha, Teddy Atkins (Josh Hutcherson, de Jogos Vorazes).
Em Diário de um Principiante, o diretor palestino Elia Suleiman pratica seu habitual estilo lacônico, colocando-se no centro da história como um visitante intrigado pelos sabores e contradições locais. Enquanto aguarda ser recebido por Fidel Castro – que está, como era seu hábito quando presidente, pronunciando um longuíssimo discurso de algumas horas, visto pela TV – o cineasta encontra diversos passatempos.
De todos, o pior episódio é Ritual, em que o argentino radicado na França Gaspar Noé (de Irreversível) dedica-se apenas a mostrar um rito de exorcismo a que uma adolescente é levada pelos pais, depois de surpreendê-la na cama com outra garota.