Ferdinando Cefalù é um barão siciliano, indolente, mimado e casado há anos com Rosalia. A chegada de uma prima adolescente, Angela, desperta a paixão proibida no quarentão - que decide que fará de tudo para livrar-se da própria mulher. De preferência, armando um flagrante de traição que lhe permita "lavar" a honra com sangue.
- Por Neusa Barbosa
- 03/01/2013
- Tempo de leitura 3 minutos
Consagrado por uma série de prêmios internacionais – Oscar de roteiro original em 1963; Prêmio de melhor comédia em Cannes/62 e Bafta de melhor ator para Marcello Mastroianni – Divórcio à Italiana correu o mundo, transformando-se num dos mais retumbantes sucessos do cinema do país e da carreira do diretor Pietro Germi (1914-1974).
Houve um único lugar, no entanto, onde essa aceitação não foi tão unânime, justamente no sul da Itália, cenário desta corrosiva história, escrita por Germi, Ennio de Concini e Alfredo Giannetti. Se a carapuça serviu, deve ter doído nos brios sulistas ver um retrato cínico assim das instituições sociais e familiares locais, que aliás não estão restritas à região.
Tal como acontece em outros trabalhos do diretor, os usos e costumes são passados na peneira fina da ironia, retratando o dilema do barão siciliano Ferdinando Cefalù (Marcello Mastroianni). Entediado no longo casamento com Rosalia (Daniela Rocca), ele sucumbe à paixão pela prima adolescente, Angela (Stefania Sandrelli) – e é correspondido. Como divórcio é coisa que as convenções locais não comportam, ainda mais numa situação familiar como essa, o barão tenta imaginar um meio de livrar-se da mulher, seja lá como for.
A falta de escrúpulos de Ferdinando é tratada com um humor negro que tempera, aliás, todo retrato do venal clã Cefalù, liderado pelo pai do barão, Don Gaetano (Odoardo Spadaro), cujas principais diversões são beliscar os quadris da jovem empregada, Sisina (Margherita Girelli) e perder no jogo parcelas consideráveis de seu patrimônio, em benefício do irmão, Don Calogero (Ugo Torrente), pai de Angela.
A volta à cidadezinha do pintor Carmelo Patané (Leopoldo Trieste), personagem do passado amoroso de Rosalia, coloca ao alcance de Ferdinando a fabricação de um imbróglio que lhe permitirá, quem sabe, um flagrante de traição e a eventual lavagem da honra com sangue, um dos mais renitentes costumes locais. Para isso, o barão contrata Patané para restaurar as pinturas de sua casa, procurando jogá-lo nos braços de Rosalia.
O clímax da situação ocorre na noite em que a cidadezinha assiste a uma disputadíssima sessão de A Doce Vida, de Federico Fellini, atração que chega com uma fama de escândalo que garante a lotação esgotada (uma divertida piada cinematográfica interna, já que o filme de Fellini é estrelado por Mastroianni).
Uma reviravolta inesperada coloca o barão em apuros. Nada que o faça desistir de sua paixão, procurando armar uma nova tramoia, com a ajuda diligente de um advogado (Pietro Tordi) e a intervenção surpreendente de uma forasteira misteriosa.
Fora a arquitetura esperta do roteiro, do filme conduzido com ritmo e veneno, Divórcio à Italiana é uma grande oportunidade para matar a saudade de Marcello Mastroianni. Na pele deste barão indolente, mimado, egocêntrico, manipulador e vaidoso – o figurino, com écharpe e penteado engomado, é qualquer coisa -, no seu costumeiro estilo natural, que não trai o esforço, ele está simplesmente ótimo. E Stefania Sandrelli, na época com 15 anos, simplesmente despontou para o sucesso internacional a partir daqui.