08/09/2024
Drama

Faroeste caboclo

O filme conta a saga de João de Santo Cristo desde sua infância, no interior da Bahia, até sua ascensão quando vai tentar a sorte em Brasília. Ajudado por Pablo, um primo distante, peruano, que vende drogas da Bolívia, ele vai trabalhar numa carpintaria, mas também se envolve com o tráfico de drogas. Um dia, por acaso, ele conhece a bela Maria Lúcia, filha de um senador. Os dois se apaixonam mas João mergulha cada vez mais numa escalada de crime e violência – até encontrar seu maior inimigo, o playboy e traficante Jeremias, rival nos negócios e no coração de Maria Lúcia. O filme é livremente inspirado na música “Faroeste Caboclo”, de Renato Russo.

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Composta no final dos anos de 1970, por Renato Russo, a canção Faroeste Caboclo só foi lançada num álbum do Legião Urbana de 1987, chamado Que país é este. É um tato sintomático que uma narrativa – sim, porque a música conta uma história – protagonizada por um herói típico esta num disco com esse nome. Se "que país é esse" fosse uma pergunta, o João de Santo Cristo poderia estar esgoelando-a por aí. Se ao longo de toda a composição Renato flerta com a canção de protesto, é no final que ele escancara com os versos: “Ele queria era falar pro presidente/Pra ajudar toda essa gente que só faz...Sofrer”. Triste revelação após a morte do personagem.
 
Faroeste Caboclo, a música, se encerra numa tradição que conta com Domingo no Parque, por exemplo. Não é apenas a letra que é forte, a melodia é sofisticada – e, claro, há o elemento político. O filme de René Sampaio aborda de forma bastante tímida esses elementos mais pungentes, para mergulhar na trama que é apenas inspirada na canção homônima. E acaba sendo curioso que momentos icônicos da música tenham ficado de fora. Portanto, a única forma de se aproximar de Faroeste Caboclo, o filme, é esquecendo a música e tomando-o pelo que ele é: um western à brasileira.
 
Nesse sentido, o filme é bastante competente. Bem escrito, bem dirigido e relativamente bem atuado, Faroeste Caboclo faz um retrato perdido no tempo , mas visivelmente situado em Brasília – daí vem parte da frustração de passar ao largo de qualquer questão política. João (Fabricio Boliveira) nasce no interior da Bahia, terra castigada pela seca, e vê o pai (Flavio Bauraqui) morrer com um tiro de soldado. Acaba no reformatório, e, mais tarde vai para Brasília. Tudo isso é contado muito rapidamente, pois a ação irá se concentrar quando ele está na capital.
 
Apesar de trabalhar como carpinteiro, começa a fazer bicos entregando drogas traficadas por seu primo Pablo (Cesar Troncoso). É assim que conhece Maria Lucia (Ísis Valverde), filha de senador (Marcos Paulo, em seu último trabalho antes de morrer, em novembro passado), a garota faz parte da burguesia da cidade e é objeto do desejo de outro traficante-mauricinho. Jeremias (Felipe Abib), o que causa toda a disputa entre ele e o protagonista. Aliás, é isso, que, no fundo, se resume Faroeste Caboclo: uma disputa entre traficantes pelo coração da mocinha e os melhores pontos para vender seu produto.
 
É um filme que segue o padrão Globo Filmes, com bom acabamento técnico, mas cheio de pudores – mesmo nas cenas de sexo supostamente ousadas – e bastante calculado para cumprir com sua função de sucesso na bilheteria. E é bem provável que fará seus milhões de ingressos.
 
Sampaio imprime ritmo de faroeste, com direito a closes nos olhos à la Sergio Leone e duelos em campinho de futebol de terra batida. Mas é excessivamente didático com uma narração em off que reitera aquilo que é visto na tela – portanto, desnecessária. No entanto, há, pesando os lados, mais qualidades do que problemas em Faroeste Caboclo, mas, talvez, o grande erro foi colocar a música no final do filme, durante os créditos. Ao ouvirmos, pensamos em tudo o que o filme poderia ter sido.
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