Abre o painel o trabalho da jovem diretora iraniana Samira Makhmalbaf, mostrando uma professora falando sobre a tragédia a um grupo de crianças afegãs que nem sequer sabem o que é uma torre - escancarando o nível de miséria daquele lado do mundo que foi punido pelos bombardeios americanos após os atentados.
O egípcio Youssef Chahine mistura tempos e nacionalidades para forjar um diálogo fantástico entre inimigos - entre eles, um mariner americano morto num atentado de 1983 em Beirute, e um homem-bomba palestino. O bósnio Danis Tanovic (Oscar de melhor filme estrangeiro por Terra de Ninguém) ergue uma ponte entre a dor das mulheres que perderam maridos e filhos na cidade de Srebrenica, na guerra que estilhaçou a ex-Iugoslávia, e os parentes dos mortos no World Trade Center.
Mas ninguém fez melhor ao traçar um paralelo com o luto vivido numa outra parte do mundo do que o sempre engajado e lúcido diretor inglês Ken Loach. Em seu trabalho, um exilado chileno em Londres escreve uma carta de solidariedade aos parentes dos mortos no atentado, lembrando uma trágica coincidência de datas: foi também numa terça-feira, 11 de setembro, só que de 1973, o golpe contra o governo legítimo do chileno Salvador Allende, que culminou no seu assassinato e no de pelo menos 30.000 civis nos anos que se seguiram, na sanguinária ditadura de Augusto Pinochet.
O mexicano Alejandro González Iñarritu (de Amores Brutos) coloca a platéia na pele dos soterrados nos destroços das torres desmoronadas, deixando-a no escuro, guiada apenas pelo som de ligações (verdadeiras) de vítimas aos seus familiares e eventuais visões terríveis, igualmente reais, de gente que se atirou das altíssimas janelas dos edifícios em chamas.
Também partiu da realidade a indiana Mira Nair, lembrando o mal-entendido que cercou um jovem de origem paquistanesa radicado nos EUA, Mohammed Salman Hamdani - que morreu entre os escombros e foi primeiro identificado como terrorista, só depois sendo reconhecido como herói que salvou diversas pessoas no local do atentado ao WTC. Já o único americano da seleção de cineastas, Sean Penn, compõe poesia pura no conto sobre um velho viúvo (Ernest Borgnine) cujo ritual diário para lembrar a mulher sofre uma modificação radical depois que some de sua janela a gigantesca sombra dos edifícios destruídos pelo atentado.
O africano Idrissa Ouedrago, de Burkina Fasso, conseguiu acender uma centelha de humor, ao contar a história de cinco meninos que julgam ter reconhecido Osama Bin Laden e fazem os mais rocambolescos esforços para capturar o terrorista e receber a recompensa de US$ 25 milhões. Fecha o excelente trabalho uma fábula do japonês Shohei Imamura, em torno de um antigo soldado imperial na II Guerra Mundial cuja loucura o faz pensar e agir como uma serpente, e que termina com a frase: "Nenhuma guerra é santa". Um ótimo lembrete para todos os cantos do mundo.
Cineweb-22/11/2002