17/04/2025

Guido Anselmi é um cineasta em crise que não sabe o que fazer em seu próximo filme. Enquanto remói suas ideias, passado e presente, realidade e delírios se confundem.

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Dos filmes de Federico Fellini, 8 ½ é possivelmente o mais conhecido (junto com A Doce Vida), homenageado, plagiado, entre outras coisas – sem nunca, é claro, chegar minimamente perto. É um filme também com o qual o diretor se distanciou ainda mais do realismo, que marcou o início de sua carreira. É um delírio, num fluxo de consciência que se dissolve até evaporar. O que sobra são fragmentos de uma mente criativa – a do cineasta e a do protagonista, o também diretor de cinema Guido Anselmi, interpretado com icônicos óculos escuros por Marcello Mastroianni.
 
A escolha desse protagonista não se dá apenas pela familiaridade de Fellini com o metiê. Guido é a verbalização das ideias do cineasta italiano – e a perfeição dos detalhes só evidencia o quanto Fellini conhece muito bem o que e do que está falando. Não que ele se interesse por uma narrativa linear. Talvez narrativa nem seja a palavra aqui, afinal o filme é um delírio caótico de momentos nem sempre conectados.
 
O protagonista revisita suas experiências desde a infância, o aprendizado sobre a vida e as mulheres, rompendo a barreira entre passado e presente, realidade e fantasia. Ainda assim, Guido não nos passa completamente incompreensível, resultando num homem que foi extremamente mimado pelas mulheres de sua vida.
 
Amarrando tudo isso, a história de um cineasta que não sabe o que fazer com sua carreira. Qual será seu próximo filme? O que fazer com esse bloqueio? Ou essa ansiedade que materializa o seu tempo também?
 
Guido é casado com Luisa (Anouk Aimée) e também tem uma amante (Sandra Milo). Com a primeira, uma intelectual, pouco tem a conversar, é uma melancolia só a relação dos dois. Com a segunda, também já não se sente confortável, embora ainda se sinta atraído por ela. Quando se dá conta, está num spa com as duas, além de outros personagens, como um produtor e diversos atores aspirando a um papel em seu próximo filme. Ao mesmo tempo, imagina a mulher ideal – interpretada por Claudia Cardinale – que é bonita, inteligente, divertida e segura. E, embora ela o desaponte em alguns momentos, torna-se sua musa.
 
Provavelmente, junto com A Doce Vida, 8 ½ é o filme que ajudou a construir o adjetivo "felliniano". Poucos cineastas tiveram essa honra. É um peso e um rótulo, é também um fetiche e uma meta que alguns tentam alcançar, quase sempre em vão. Mas a cópia restaurada dessa obra-prima explica facilmente o porquê de tanta fascinação.
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