Prejudicado pelo mal de Alzheimer, o octagenário Claude tem bons e maus dias. Implica com as cuidadoras e dá trabalho para a filha Carole, que resiste a interná-lo numa casa de repouso. Mas a insistência de Claude em partir para a Flórida, buscando a outra filha que não veio mais vê-lo, coloca-o entre a aventura e o perigo.
- Por Neusa Barbosa
- 01/08/2016
- Tempo de leitura 2 minutos
O título e o cartaz de filme francês A Viagem de meu pai, de Philippe Le Guay, sugerem um road movie. A expectativa que se constrói em torno dessa viagem, que tem por destino a Flórida, alimenta o clima de uma complexa e delicada relação familiar, envolvendo um pai octagenário e afetado pelo Alzheimer, Claude (Jean Rochefort) e uma filha, Carole (Sandrine Kiberlain).
Partindo de uma peça de teatro – Le Père, de Florian Zeller – o diretor e corroteirista Le Guay joga habilmente com as tensões geradas pela doença do pai, que é voluntarioso e implicante com todas as suas cuidadoras, evitando jogar a história toda num abismo de melodrama. Sem escamotear o alto custo para Carole de sua recusa de internar Claude numa residência para idosos, projeta-se o relacionamento dos dois como uma troca afetuosa, ainda que sujeita a uma constante gangorra emocional.
Interpretada com sutileza e segurança pela experiente Sandrine Kiberlain, Carole é uma personagem feminina centrada e respeitável. Não é nada simples o equilíbrio que mantém à frente de um lar em que convivem, além do pai exigente de cuidados, seu filho adulto (Clément Métayer) e um novo marido (Laurent Lucas). Fora dali, coube a ela salvar o negócio familiar, assumindo-o quando a sanidade do pai declinou.
A sombra de uma irmã que há anos foi para os EUA é o elemento desagregador. Claude insiste no projeto de visitar a filha distante, constantemente dissuadido por Carole, no que parece uma reação de ciúme ou rejeição. Há mais sobre isso do que convém comentar aqui e a maneira como este segmento se encaixa na trama é particularmente bem-sucedida para que o filme não se transforme num vale de lágrimas.
Contribui enormemente neste sentido a interpretação generosa do veterano Jean Rochefort, o ator conhecido por sucessos e cults como O Marido da Cabeleireira e Caindo no Ridículo. Quando consegue dominar seus lapsos de memória, ele mostra seu aspecto sedutor, malandro e imaginativo ao tratar com sua nova cuidadora, a jovem Ivona (a romena Anamaria Marinca, da Palma de Ouro 2007 4 meses, 3 semanas e 2 dias), e em suas conversas com o neto. Estes momentos revelam algo do homem que ele foi, do qual se enxergam apenas fragmentos.