Limites é um filme que já se viu algumas vezes, seguindo mais ou menos a mesma história: pais e filhos que sempre tiveram um relacionamento tenso e não se veem há anos precisam por força do acaso (ou do roteiro) enfrentar um tempo juntos, para resolver os fantasmas do passado. Aqui, no caso, são pai e filha. A história é batida, mas Christopher Plummer e Vera Farmiga são tão carismáticos e estão tão bem em seus papeis que os eventuais deslizes (e neles se inclui a previsibilidade) do filme são perdoáveis.
Ela é Laura, uma mulher divorciada que cria o filho adolescente, Henry (Lewis MacDougall), sozinha. Seu emprego consiste em ser secretária de uma amiga rica e fútil. Ainda assim, ganha pouco e as coisas pioram quando seu filho é expulso da escola pública, por ser problemático demais. A única saída é matriculá-lo num colégio particular. Para conseguir pagar, porém, ela precisa voltar a falar com o pai, Jack (Plummer).
Esse é outro problema na vida de Laura. Depois de evitar as ligações dele por tempos, ela o chama e descobre que ele acaba de também ser expulso da casa de repouso onde morava. Sem condições de cuidar dele, resolve levá-lo até a irmã (Kristen Schaal), numa viagem de carro. Nessa jornada, Jack aproveita para fazar a entrega da maconha orgânica que cultivava na estufa do lugar onde morava. Mas, claro, não contará para a filha, embora precise da ajuda do neto.
Plummer, como o avô traficante e bem-intencionado, é alma do filme. Mas é Farmiga quem coloca os dois pés de Limites no chão. Sua personagem é o centro de consciência do longa, escrito e dirigido por Shana Feste. Há um equilíbrio entre os momentos ternos, os cômicos e alguns de enfrentamento – tanto entre pai e filha, como entre Henry e seu pai ausente (Bobby Cannavale), e o filme lida com tudo isso com muita sobriedade.
Laura é praticamente obcecada com animais abandonados. Não pode ver um cão ou gato largado na rua que já o adota e coloca em sua casa – ou no carro, se o bicho for encontrado no meio do caminho. É uma metáfora simples para o estado emocional de abandono dela mesma – largada pelo pai, pelo marido – e até do filho, cujo pai foi embora sem manter contato depois. É algo óbvio, mas dentro do filme funciona bem.
Ao longo da jornada, entre os vários fregueses de Jack, o trio também visita um antigo amigo dele – interpretado por Christopher Lloyd – e um ex-astro de cinema (Peter Fonda, num dos momentos mais cômicos do filme, quando a casa dele é invadida). Laura, obviamente, pensa que o pai apenas está visitando conhecidos. Talvez seja um dos poucos lapsos do filme. É difícil acreditar na ingenuidade dela – especialmente por conta das diversas paradas que o pai os obriga a fazer enquanto fala com desconhecidos. A ingenuidade dela, no entanto, gera outro ótimo momento quando a verdade vem à tona.
Plummer, com mais de meio século de carreira, não precisa provar nada a ninguém. Obviamente, nem Farmiga, mas ela brilha aqui, numa personagem que, em mãos menos habilidosas, cairia na caricatura ou se transformaria numa figura chata. A atriz encontra a humanidade que há em Laura, uma mulher ferida que sempre se submeteu a um padrão de relacionamentos – o ex-marido pouco difere de seu pai. E o escocês MacDougall, que já havia mostrado a que veio em Sete minutos antes da meia-noite, prova que é um jovem ator a se prestar atenção.