08/02/2025
Comédia dramática

Praça pública

Castro é um apresentador de TV famoso e decadente. No momento, sua produtora, Nathalie, negocia com o canal para que não cancelem seu programa. Ela organiza também uma festa em sua nova casa, no campo, à qual comparecem o apresentador, sua nova mulher atriz e várias celebridades, como Biggistar, o novo influencer na internet.

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Experiente atriz e diretora, a francesa Agnès Jaoui é notável pela capacidade de armar labirintos dramáticos onde, a princípio, nos perdemos, no emaranhado de personagens e situações boiando num certo caos da vida. É o tipo de desafio que percorre seus filmes anteriores, como O Gosto dos Outros (2000) e Questão de Imagem (2004), e também este seu mais recente trabalho, Praça Pública.
 
Como sempre, este turbilhão criativo que ela aciona na tela é uma construção a quatro mãos, com roteiro assinado por ela e seu habitual parceiro, o ex-marido Jean-Pierre Bacri. Eles mesmo atuam neste universo pautado por um bocado de hipocrisia, liderado por um decadente apresentador de TV, Castro (Bacri), sua produtora, Nathalie (Léa Drucker) e a irmã dela, ex-mulher dele, Hélène (Jaoui).
 
A ocasião que conduz o filme é uma grande festa, numa linda propriedade rural perto de Paris, onde a produtora Nathalie recebe convidados famosos. Enquanto isso, ela mantém nervosas negociações ao telefone com os donos da emissora de TV, que querem demitir Castro, entendendo que o prazo de validade dele já passou. Os novos tempos indicam que o reinado agora é das celebridades vazias da internet, como um dos convidados da festa, Biggistar (Mister V), o famoso quem, jovem que não é artista nem nada mas garante milhões de visualizações e seguidores na rede ninguém sabe exatamente porquê.
 
Castro, por sua vez, não é muito melhor como produtor de conteúdo. Mantém-se no ar à custa de entrevistas sensacionalistas em que procura arrancar detalhes íntimos de seus convidados para satisfazer a curiosidade mórbida de seu público, formado por donas-de-casa, ao que se sabe. Ele faz o tipo desiludido – que cai tão bem a Bacri -, descarregando seu niilismo em tudo e todos, como seu motorista, Manu (Kévin Azaïs), além das cenas de ciúme com a atual mulher, a bela atriz Vanessa (Héléna Noguerra).
 
Jaoui interpreta Héléne, uma mulher engajada em causas, no momento, a coleta de assinaturas em prol de uma refugiada afegã ameaçada de deportação. Ela e Bacri formam estes dois opostos, um total descrente de tudo que usa o seu ceticismo para fazer o que bem entende, sem prender-se a crenças ou pruridos éticos, ela, uma idealista com seus sonhos e defeitos, mas afinal interessada em alguma coisa além do próprio umbigo.
 
Nem por isso a diretora e roteirista romantiza demais o próprio papel, expondo sua personagem a questionamentos e alguns ridículos que fazem rir. Jaoui nunca perde de vista a comédia humana, o grande caos que é o mundo, tornando a festa central uma espécie de amostra do mundo contemporâneo, em que convivem Guy (Grégoire Oestermann), um agricultor biológico; o vizinho de Nathalie, um camponês enfezado com o barulho da festa (Michel Masiero); a filha do ex-casal Héléne/Castro, Nina (Nina Meurisse), que expõe características dos pais num novo livro; a garçonete ávida por fotografar celebridades (Sarah Suco); e o novo namorado da produtora, o russo Pavel (Miglen Mirtchev), incapaz de pronunciar uma frase correta em francês.
 
O forte de um filme como este está nesta composição de personagens, que refletem tantos aspectos dos tempos atuais sob uma luz zombeteira, como dizendo: “Meu Deus, como nós, seres humanos, somos ridículos em nossas hipocrisias e aparências. Por que nos levamos tão a sério?”. Salva-se alguma coisa? Quem sabe? Afinal, ainda existe o amor.
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