Boi de lágrimas, de Frederico Machado, faz parte do projeto Filme Político – integrado por ele, Cristiano Burlan, Dellani Lima e Taciano Valerio Alves Da Silva. É um longa que tenta compreender o nosso presente político, social e cultural. Nunca é fácil (talvez nem possível) compreender um momento histórico quando se está inserido dentro dele, por isso mesmo, este é mais um filme-ensaio do que qualquer outra coisa – pois, como já disse Adorno, essa é a forma que “evoca aquela liberdade de espírito”.
O quarto longa de Machado segue o mesmo caminho dos anteriores, como O exercício do caos, nos quais a beleza estética salta aos olhos, às vezes, encobrindo as questões mais densas que estão ali. Em Boi de lágrimas, no entanto, o aspecto político vem à tona desde sua abertura, uma coletânea de discursos dos mais diversos líderes políticos e sociais – que inclui uma fala do ex-presidente Lula, quando ainda era líder sindical. A investigação do presente se dá pelo prisma do trabalhador, tendo como ponto de fuga e partida as manifestações contrárias às reformas trabalhista e da previdência em 2017.
O lado cru da realidade exasperante da contemporaneidade se contrapõe ao lúdico da fantasia do Bumba meu boi. Um dos personagens é tocador de pandeiro, num grupo desses, na periferia de São Luís. Sua filha é uma jovem dançarina de Boi, cuja consciência política começa a despertar nesse momento de manifestações. As relações entre personagens se dão de maneira que beiram o abstrato, quase sem diálogos.
A pergunta que paira é: qual o papel da cultura popular em tempos de obscurantismo político e social? Ela teria a capacidade de nos salvar? Se é que precisamos – ou existe a possibilidade de – sermos salvos. Machado é um cineasta sagaz, que não está interessado em respostas, mas em levantar questões, discussões. Seus filmes, embora visualmente bonitos, não são de fácil compreensão, mas oferecem algumas recompensas àqueles interessados em desbravá-los.