Dirigido por Walter Salles, a partir de roteiro de Gabriela Amaral Almeira, o curta Quando a Terra Treme tem um título que remete ao clássico de Luchino Visconti, A Terra Treme, de 1948, no qual um jovem pescador de uma comunidade se rebelava contra a ganância de seus patrões. O filme brasileiro tem como tema também a ganância dos ricos e poderosos, colocando como ponto de partida de sua narrativa o rompimento da barragem da Samarco sobre vários povoados de Minas Gerais, em 5 de novembro de 2015, deixando centenas de desabrigados, 19 mortos e uma pessoa desaparecida.
É a partir desse desaparecimento que o curta constrói sua trama. É ficção, mas calcada no documentário, acompanhando famílias que perderam tudo na tragédia. A protagonista é a professora Luciana (Maeve Jenkings) cujo marido (Rômulo Braga) desaparece na noite fatídica. Morando ao lado de outras famílias desabrigadas, ao lado de seu filho pequeno, Guto (Richard Santiago), ela espera: espera sair da situação provisória, espera que o corpo do marido seja encontrado. O garoto, por outro lado, ainda tem certeza de que seu pai está vivo.
Quando a Terra Treme se dá, então, nesse vácuo entre a existência e a espera. Disso, no entanto, surgem também laços de afeto e solidariedade. É particularmente bonita a cena em que Luciana dá aulas para as crianças do abrigo fazendo do chão sua lousa. Todas as pessoas na mesma situação parecem depender exclusivamente umas das outras.
A fotografia de Inti Briones é particularmente eficiente em capturar a destruição da natureza. O prólogo todo escuro dá espaço a uma imagem de um mundo que parece coberto de ouro, mas é lama. É só o começo da destruição. Tematicamente, o filme está alinhado com a obra do diretor, na qual, muitas vezes, uma criança está em busca do pai. É, de certa forma, uma revisita a Central do Brasil – mas uma versão mais melancólica, com menos esperança. Novamente, uma criança em busca de um país que lhe dê o que precisa. Aquela do final dos anos de 1990 parecia ter ainda alguma esperança. Aqui, Guto olha ao seu redor e o que vê é impunidade, destruição e lama.
O curta faz parte de um longa coletivo, "Where Has the Time Gone?" (Para Onde Foi o Tempo?), produzido pelo chinês Jia Zhangke, com cineastas de diversos lugares do mundo observando a contemporaneidade. O filme foi exibido na Mostra internacional de Cinema em São Paulo, em 2017.