17/01/2025
Drama Comédia

O Pai

O fotógrafo Pavko vem assistir ao enterro da mãe no interior. Pensa em voltar rapidamente para casa, onde o esperam problemas de trabalho e o acompanhamento da gravidez de risco da esposa. No entanto, seu pai, Vasko, entra em parafuso quando uma cunhada lhe garante que recebeu uma mensagem da falecida no celular.

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Lançado diretamente no streaming nestes tempos em que a pandemia mantém os cinemas fechados, O Pai é um exemplar digno de um bom cinema feito na Bulgária e que tem sido notado no circuito europeu de festivais. 
A dupla de roteiristas e diretores, Kristina Grozeva e Petar Valchanov, tem boas credenciais em seus filmes anteriores, A Lição (2014) e Glory (2016), ambos agudos retratos de seu país, abalado por uma pesada herança autoritária que ainda se faz notar na burocracia onipresente. Em O Pai, um trabalho ainda mais maduro e sofisticado, premiado nos festivais de Karlovy Vary, Triste e Tirana, os diretores aprofundam um estilo que nunca descuida de um intimismo delicado, ao mesmo tempo em que lança um olhar irônico às convenções e instituições.
 
A história se fecha na conturbada relação entre pai, Vasko (Ivan Savov), e filho, Pasko (Ivan Barnev), retomada a partir do funeral da matriarca da família, Valia. Uma série de compromissos aguarda Pasko depois deste enterro. Fotógrafo, ele está atolado num trabalho que está dando problemas. Além disso, sua mulher, Kalina (Margita Gosheva), vive os últimos dias de uma gravidez de risco. 
 
Todo o planejamento do filho para uma rápida permanência na casa dos pais vai por água abaixo devido ao comportamento cada vez mais imprevisível do pai. Não só Vasko está sem chão pela morte da mulher como ficou perturbado por uma estranha revelação da cunhada, Lyubka (Tanya Shahova) - ela garante ter recebido uma mensagem em seu celular vindo do celular da morta e é a primeira a entrar em pânico com o suposto episódio sobrenatural. Mais ainda o viúvo, que se obstina em procurar os serviços de Ruvi, um místico da região.
 
Ao longo dos inúmeros acidentes na jornada deste pai e filho, unidos por uma mistura um tanto bruta de afeto e ressentimentos, desenvolve-se um bem-humorado mergulho na identidade masculina, que demonstra uma universalidade com a qual talvez não se contasse no ponto de partida. Mais do que em seus dois filmes anteriores, os cineastas evidenciam a ironia que paira sobre todas estas confusões familiares, os esforços atabalhoados do viúvo para descobrir a tal mensagem que a morta teria tentado passar e também o desespero do filho para injetar alguma racionalidade nos procedimentos - em vão.
 
Nesta tragicomédia de erros, as instituições búlgaras são retratadas com a peculiar irreverência de Grozeva e Valchanov, a partir dos incidentes numa delegacia e num hospital no caminho do pai e do filho. No fundo, é de culpa que toda a história está tratando, em relação a mulheres que, mesmo sem estar diretamente presentes na tela, pairam sobre a consciência destes dois homens de gerações diferentes de maneira indelével. Como sempre na vida, nada disto pode ser aliviado sem muitos equívocos. Terá seu papel igualmente uma misteriosa geleia de marmelos com gerânios, uma espécie de receita búlgara para a reconciliação.
 
 

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