23/03/2025
Drama

Corpus Christi

Depois de passar por uma transformação espiritual na detenção, Daniel quer seguir carreira religiosa, mas sua ficha criminal o impede. Porém, quando sai em liberdade condicional, encontra um vilarejo onde tem a chance de passar-se por clérigo.

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A premissa do drama polonês Corpus Christi, indicado ao Oscar de filme em língua estrangeira, pode parecer exagerada: um homem se faz passar por padre e engana uma comunidade inteira. Mas, conforme o roteirista do longa, Mateusz Pacewicz, contou ao site Notes from Poland, descobriu-se que algo semelhante aconteceu, ao menos, uma dúzia de vezes no país. “Esse é um fenômeno social”, definiu ele. Aconteceu, inclusive, na região dos Cárpatos, onde ocorreram as filmagens.
 
Aqui, o protagonista, Daniel (Bartosz Bielenia), é um jovem que acaba de sair em liberdade condicional de um reformatório, para assumir um emprego garantido numa serraria. Por obra do acaso, ele acaba se passando por religioso num vilarejo que enfrenta o trauma de uma tragédia. O que faz de um padre um padre? Fora, obviamente, a fé, existe uma preparação que envolve teologia, história, filosofia e uma série de outras disciplinas num período em que a vocação também é testada até a ordenação. O rapaz pula todas essas etapas e vai direto presidir uma paróquia, cujo titular teve que afastar-se temporariamente.
 
Mas há uma complicação nesse personagem. Ele não é apenas um vigarista, ele realmente queria ser um padre, mas sua ficha criminal o impede de entrar para o seminário. Apesar do nervosismo inicial em seu fingimento, Daniel se vale dos sermões que ouviu na prisão e do uso da internet para informar-se dos protocolos, como para ouvir uma confissão.
 
Há pouco tempo no vilarejo, sete jovens morreram num acidente de carro, e até hoje todos os moradores ainda lidam mal com o luto dessa perda, fazendo vigílias na estrada onde isso aconteceu. Daniel acredita ser então a liderança espiritual de que tanto necessitam nesse momento de dor. Eles também parecem desesperados em busca de alguém que lhes dê conforto espiritual. É uma comunidade que, com seu comportamento de rebanho, aceita ordens sem questionamento e, por isso, tomam Daniel como o padre sem pestanejar.
 
Dirigido por Jan Komasa, Corpus Christi investiga a hipocrisia que pode pautar as relações religiosas. Não é necessariamente uma crítica à fé ou à crença, mas à maneira como essas servem de instrumento para dominação social e silenciamento. O cineasta faz um filme rigoroso e solene – especialmente dado o cenário da igreja e a trilha sonora – que encontra em Bielenia (um ator com dez anos a mais que seu personagem) o intérprete perfeito para o atormentado Daniel.
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