07/02/2025
Drama

Perdas e Danos

Stephen Fleming é um político em ascensão com uma família perfeita. Porém, ele perde o chão quando conhece a nova namorada do filho, com quem se envolve num relacionamento tórrido.

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Perdas e Danos é um filme meticulosamente frio, o que produz um estranhamento entre a sua forma e a história que se vê na tela: de uma paixão doentia. A questão que o diretor Louis Malle está levantando é exatamente essa: isso é uma paixão? Ou apenas um relacionamento doentiamente obsessivo ?
 
Anna (Juliettte Binoche) é uma personagem que sorri com ternura apenas em uma cena, é como se baixasse sua guarda em apenas um momento. O primeiro encontro entre Anna e Stephen Fleming (Jeremy Irons) deixa claro que existe uma chama sexual entre os dois. Sem muitas palavras, apenas um aperto de mãos, e tudo fica claro, eles vão ter um caso. A questão torna-se mais complicada pelo fato de ela ser namorada do filho dele, Martyn (Rupert Graves). Mas nada impede os amantes de manter um relacionamento exclusivamente sexual, repleto de malabarismos na cama, no chão, ou onde mais puderem estar juntos.
 
Malle, trabalhando com um roteiro do dramaturgo David Hare, a partir do romance homônimo de Josephine Hart, investiga os mecanismos de uma tragédia anunciada numa família burguesa cheia de hipocrisia. Fleming, que, apesar da idade, começa a comportar-se como um adolescente apaixonado idiota, é um membro do Parlamento inglês pelo partido Conservador, a favor da família e da moral, obviamente. Anna, por sua vez, é uma vítima em tudo isso, na verdade. Repleta de traumas, ela é uma pessoa machucada e, como diz, as pessoas machucadas devem ser temidas pois sabem que é possível sobreviver à dor.
 
Malle e Hare são capazes de levar à tela toda potência explosiva do livro original de Hart, trazendo ainda mais nuances ao relacionamento e à obsessão. É uma bomba prestes a explodir e, quando, explode, perto do final, espalha estilhaços para todos os lados. Miranda Richandson, como esposa de Fleming e mãe de Martyn, tem alguns dos melhores momentos de sua carreira nesse filme – que lhe rendeu uma indicação ao Oscar.
 
Rever Perdas e Danos quase 30 anos depois de seu lançamento original, num mundo que parece ainda mais reacionário do que aquele do começo da década de 1990, é ver como o cinema sempre foi capaz de expor de maneira crítica – até numa história que não seja abertamente de tema político ou social – a hipocrisia da elite. Malle, não poucas vezes, cutucou a burguesia trazendo, no mínimo, desconforto, seja com a masturbação da personagem de Jeanne Moreau numa banheira, em Amantes, em 1958, ou na relação quase incestuosa entre mãe e filho, em Sopro no Coração, de 1971. Aqui, ele pode não estar no melhor de sua forma, mas, ainda assim, faz um filme que incomoda pelos motivos pensados para incomodar – ou seja, um acerto.
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