16/03/2025
Documentário

Biocêntricos

Com narração de Janine Benyus, escritora e criadora da Biomimética, o documentário traz histórias de pessoas e empresas que buscam maneiras de transformar o mundo e proteger a natureza, usando ela mesma como exemplo.

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Não que o documentário brasileiro Biocêntricos seja destituído de boas intenções, mas estas parecem estar no lugar errado. Ao invés de celebrar as proezas científicas e/ou a diversidade da natureza, o filme de Fernanda Heinz Figueiredo e Ataliba Benaim é um retrato enaltecedor de uma espécie de econeoliberalismo que, por sua vez, encontra num discurso liberal a desculpa para uma exploração supostamente consciente da natureza.
 
Belas imagens naturais e uma narração didática em inglês deixam duas coisas bem claras: o filme não foi barato e visa um mercado internacional também. Do discurso de um indígena – um tanto deslocado nesse cenário – a um rapaz carioca que vive no meio da natureza, há a exaltação de uma vida mais pura em comunhão com o mundo natural. São pessoas chamadas apenas pelos primeiros nomes, tentando trazer uma proximidade entre o público e elas. No caso, tratam-se do líder indígena Benki Piyãko, do povo Ashaninka, localizado no Acre, na fronteira entre Brasil e Peru, e o designer Bruno Rutman Pagnoncelli, que desenvolveu uma forma premiada de reflorestamento.
 
A figura central que atravessa o filme, no entanto, inclusive como narradora, é a escritora norte-americana Janine Benyus, que criou o termo Biomimética, que pesquisa na natureza suas formas de organização e vida a fim de colocar em prática coisas semelhantes na vida humana a fim de resolver problemas.
 
Tudo muito bonito, tudo muito bem intencionado, até chegar a uma empresa de cosméticos e se transformar numa grande propaganda na figura de sua gerente científica, explicando que na empresa ela consegue fazer pesquisas que na academia teria “extrema dificuldade de fazer”. O que nos leva a perguntar: por que não conseguiria fazer? Por visar meramente o lucro?  
 
Os franceses Pierre Dardot e Christian Laval criaram o termo “razão neoliberal”, e, dessa forma, explicam como o neoliberalismo coloniza todos os campos de nossa vida no presente. Vivemos embrenhados no meio dessa razão, e Biocêntricos é um claro exemplo disso. Ao retratar pessoas que “fazem a diferença” para o meio ambiente sob uma ótica de empreendedorismo – mesmo que isso nunca seja dito abertamente –, o documentário chancela essa ideia da exploração consciente da natureza, que mesmo consciente, ainda é exploração capitalista.
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