14/01/2025
Documentário

Poeta de Sete Faces

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Mundo mundo vasto mundo,se eu me chamasse Raimundoseria uma rima, não seria uma soluçãoOs versos acima, tirados do Poema de Sete Faces (Alguma Poesia, 1930), podem ser um excelente fio condutor para o novo filme do diretor mineiro Paulo Thiago, Poeta de Sete Faces. Sob a forma de documentário, o cineasta mostra, ao mesmo tempo que investiga, documenta e interpreta, os diversos momentos da vida e obra de Carlos Drummond de Andrade.

Um ponto forte da produção é a decididamente acertada fuga do formato documental padrão, ao privilegiar um retrato lírico da trajetória humana do poeta de Itabira. Por essa razão, a produção transcende o mero registro da vida do escritor ao privilegiar o formato de documentário poético, no qual a emoção da arte drummondiana está presente, definindo o texto, a imagem, a música, a montagem e o desenvolvimento dramático do filme.

Paulo Thiago, conhecido por filmes como Águia na Cabeça, Jorge, um Brasileiro e Policarpo Quaresma, passa, sem qualquer dúvida, sua imensa paixão pelo poeta. Some-se a isso a tocante interpretação dos atores, especialmente de Paulo José, que protagonizou Policarpo. Vê-los declamando os poemas tão singulares de Drummond, além de surpreendente, é um bom exercício de exploração dos sentidos, tantas vezes apagados pela rudeza do cotidiano.

O documentário pode ser visto também por suas qualidades didáticas: divide-se em três etapas que correspondem às fases distintas da obra de Drummond. A primeira , "Vai Carlos, ser gauche na vida", registra desde o seu nascimento em Itabira, em 1902, até o final da sua "Poesia Modernista", em Belo Horizonte, antes da mudança para o Rio de Janeiro, em 1934. É a fase marcada pelo movimento modernista de 1922 e também pela publicação dos primeiros livros: Alguma Poesia e Brejo das Almas - quando nasce o Carlos Drummond de Andrade dos versos anedóticos, sintético-metafóricos e irônicos.

A segunda fase, "A vida apenas, sem mistificação", começa com a mudança de Drummond para o Rio de Janeiro e vai mostrar o "poeta do seu tempo", o momento de atuação política na vida do escritor, aliado à sua obra de crítica social. E por fim a terceira fase, "Como ficou chato ser moderno, agora serei eterno", do início dos anos 50 aos 80. É o período do poeta-filósofo, do verso enigmático, do cronista de sucesso no Correio da Manhã e no Jornal do Brasil, da glória literária, dos prêmios e homenagens, dos filmes adaptados de sua obra e do retorno aos temas do passado e da memória.

Sem dúvida, as qualidades artística e acadêmica da produção possivelmente podem se tornar referência para novas produções do gênero. Mesmo se não for aceito pelo público convencional, terá, indubitavelmente, muito a acrescentar às nossas escolas, que parecem ter esquecido a fascinação e o encanto da poesia.

Cineweb-1/11/2002

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