Marcelo Valle é um ótimo ator que, até agora, não tinha tido sua grande chance seja no cinema – onde trabalhou em filmes como Meu passado me condena e O vendedor de sonhos –, ou na televisão – em novelas como Insensato coração e Paraíso tropical. Ele é sempre o coadjuvante competente que, eventualmente, acaba roubando a cena. Até agora, pois Como é cruel viver assim tem tudo para mudar isso. No filme, dirigido por Julia Rezende, ele é Vladmir, um sujeito desempregado que se une a outras três pessoas para sequestrar o ex-patrão de uma amiga.
Valle, que já fez esse mesmo personagem na peça original, destaca-se como o homem frustrado e sem perspectivas que pensa em dar condições melhores de vida à namorada, Clívia (Fabiúla Nascimento). Ela, por sua vez, sonha em se casar. Quem dá a ideia do rapto é uma amiga dela, Regina (Debora Lamm), babá desempregada que conhece todos os hábitos e horários do antigo patrão, o que, a priori, o transformaria numa presa fácil.
O grande problema é que nenhum deles já fez algo parecido. São todos pobres e sem muito futuro, mas até então honestos. Junta-se a eles um vizinho, conhecido como Primo (Silvio Guindane), que é ainda mais sem noção. Eles plenejam o sequestro, contam com a ajuda de uma espécie de mafioso mais experiente (Otávio Augusto), que delega a função a um de seus agregados (Paulo Miklos). Flávio (Milhem Cortaz), o ex-namorado de Clívia, assumidamente bandido, vai proteger e dar uma assessoria, mas, de princípio, ele tenta desencorajar: “Sequestro não é fácil. Nem eu faço.”
Mas o quarteto está decidido e começa a organizar a logística, digamos assim, da operação, que envolve até o esquema de capturar a vítima e a trazer para a casa de Clívia, onde também funciona uma lavanderia, até comprar os mantimentos para o sequestrado.
Rezende, que é conhecida por dirigir comédias românticas – como Meu passado me condena e Um namorado para a minha mulher –, muda o registro aqui, para algo mais agridoce, até mesmo tragicômico. A comédia vem da falta de noção do grupo, de sua visão de um sequestro moldada pelos clichês do cinema e da televisão. O humor está diretamente ligado ao despreparo, inocência e ingenuidade do grupo. A tragédia, por sua vez, é de suas vidas um tanto miseráveis, a busca, sempre infrutífera, de um futuro melhor.
O roteiro é assinado por Fernando Ceylão, que tira proveito de sua peça original, com o texto afiado, diálogos rápidos que imprimem o tom ágil do filme. Há elementos cômicos que realmente não funcionam – como o "Poderoso chefão" de Otávio Augusto sentado numa poltrona feita com uma banheira velha. Mas, quando o quarteto se reúne, o filme extrai o melhor que pode deles – e ajuda o fato de ter atores e atrizes bastante competentes em cena.