Um dos nomes fundamentais do Cinema Novo, Cacá Diegues foi convidado ao Festival de Cannes em competição pelo menos três vezes, nos anos 1980 (Bye Bye Brasil, Quilombo e Um trem para as estrelas), fora outras passagens em mostras paralelas e júri (Caméra d’Or, 2012). Em 2018, ele veio fora de competição, com seu drama musical O Grande Circo Místico, coprodução com Portugal e França concluída em 2015 e que foi escolhida como representante brasileira na disputa de uma indicação na lista do Oscar de filme estrangeiro.
O roteiro, do próprio Cacá e George Moura, expande um poema de Jorge de Lima, e acompanha várias gerações de uma família circense, a partir de 1910. Amparado nas belíssimas músicas de Chico Buarque de Holanda e Edu Lobo para o musical homônimo dos anos 1980, o filme ostenta visível ambição técnica e visual para materializar sonhos. Uma das características mais evidentes deste registro em busca do fantástico é o personagem de Celavi (Jesuíta Barbosa), mestre de cerimônias do circo que acompanha as diversas gerações ao longo do tempo sem envelhecer – e é uma das presenças mais carismáticas da história, como alívio cômico e tudo o mais.
Nem tudo o mais funciona tão bem. A narrativa de Cacá é, assumidamente, uma corrida em faixa própria, fiel apenas àquilo em que o cineasta acredita, sem dar bola para a torcida, como se diria popularmente. O perigo, nisso tudo, é não conseguir encantar o público na mesma medida, ainda mais que as sensibilidades modernas para a figura feminina e o sexo podem não sentir-se à vontade nesta visão. As cenas de sexo, por exemplo – fora a primeira (um tanto voyeur), as demais são todas situações em que as mulheres estão desconfortáveis ou são forçadas mesmo. Em contraponto, a sequência em que duas moças “voam” nuas – um trabalho de efeitos especiais – funciona com um pouco mais da leveza que faltou em outros momentos, apesar de uma visão um tanto datada de erotismo.