15/03/2025
Terror

Men - Faces do medo

Depois de perder o marido em circunstâncias trágicas, Harper se isola numa casa de campo para lidar com o luto. Mas diversos homens, todos com o mesmo rosto, embora diferentes, parecem a ameaçar.

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Em Men – Faces do Medo, o roteirista e diretor britânico Alex Garland leva bem ao pé da letra a ideia de que “homem é tudo igual”, e coloca todos os personagens masculinos – com exceção de um deles – interpretados pelo mesmo ator, Rory Kinnear (Peterloo). Com isso, ele cria em seu filme camadas de terror de um pesadelo do qual a protagonista, Harper (Jessie Buckley), não consegue despertar.
 
Garland, que começou sua carreira como romancista constrói um filme bizarro que certamente vai desagradar a muitos – especialmente em seus excessos de simbolismos e metáforas, e escassez de explicações –, mas deve dialogar com quem deixar se levar pela a loucura do diretor que resulta num filme visualmente hipnótico carregado em tons de verde e vermelho, num resultado que mais parece alucinação do que cinema.
 
Na primeira cena, Harper está em seu apartamento, em Londes, e vê um homem cair em câmera lenta em frente à sua sacada. Pouco depois descobrimos que se trata do seu marido, James (Paapa Essiedu), um homem com problemas emocionais com quem ela acaba de ter uma briga séria. Aos poucos, no entanto, Men descortina melhor a realidade do casal, e os minutos anteriores à queda: acidente? Suicídio?
 
Tentando se refazer, Harper aluga uma casa de campo luxuosa, numa região isolada, onde é recebida por George (Kinnear), um sujeito estranhamente excessivamente simpático e solícito, mas um personagem um tanto cômico em sua maneira ridícula. O lugar é calmo, e ela nem precisa trancar a porta, diz ele. Qualquer pessoa, assistindo a um filme, sabe que isso é um alerta: a porta DEVE ser trancada.
 
Depois de se acomodar, Harper sai para explorar o entorno, e se embrenha numa mata verde vibrante, que Garland e o diretor de fotografia Rob Hardy – parceiro do cineasta em seus dois outros longas, Ex_Machina e Aniquilação – filmam de forma exuberante. A protagonista, usando um casaco verde musgo, acaba como que se mimetizando à paisagem, até que encontra um túnel abandonado – ali passava uma estrada de ferro. Enquanto brinca com o eco que se faz na construção, ela vê um homem na outra ponta. Ele está nu e coberto de feridas – novamente, interpretado por Kinnear.
 
No dia seguinte, ele aparece em seu jardim. A cena toda, novamente, é construída de maneira lenta. Demora até que Harper perceba que ele está na sua propriedade, embora nós já o vimos pela parede de vidro, para a qual ela está de costas. Depois do incidente, ela chama a polícia, e vêm um policial (obviamente, Kinnear) e uma policial (não, ela não é interpretada por Kinnear, mas por Sarah Twomey). Quando vai a uma bela igreja, depois de um momento de epifania, ela sofre bullying de um menino (Kinnear, em efeitos digitais) e abuso emocional do vigário local (advinha quem o interpreta).
 
Todos os homens são tóxicos e culpados em Men – o que talvez não seja algo tão diferente do que acontece no mundo real. Ao se valer do gênero do terror, Garland (ele mesmo um homem com, claramente, sentimento de culpa histórica, social e cultural) expõe de maneira exagerada aquilo que se dá, muitas vezes de forma velada. O que ele quer dizer com os vários homens interpretados pelo mesmo ator pode ir do gosto de cada um, mas é inegável que o diretor abraça a alegoria – do momento, no começo, quando, ao chegar à casa de campo Harper, à la Eva, come uma maçã direto da árvore – ao simbolismo surreal, no clímax, no qual a anatomia humana é subvertida a cada momento.
 
O resultado, claramente, é louco, bizarro, absurdo – ou qualquer outro adjetivo que se queira colocar ao lado do nome do filme. Novamente, vai ao gosto do freguês. Mas também pode se chamar de obra-prima – para isso é preciso estar aberto ao que Garland propõe em Men, uma viagem surreal e alucinatória, que se tornam as ferramentas para retratar algo quando o realismo já é limitado demais para figurar, ora a ironia, a realidade.
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