15/01/2025
Documentário

Amanhã

Em 2002, o documentarista Marcos Pimentel filmou um trio de crianças, os irmãos Julia e Christian, que moravam numa favela ao lado de uma lagoa em Belo Horizonte. Do outro lado, numa casa de classe média alta, estava Zé Thomás. Durante dois finais de semana as crianças visitaram umas a casa das outras. Vinte anos depois, o diretor procura novamente essas crianças, hoje adultos, e seus destinos mostram os caminhos que o Brasil tomou nessas duas décadas. Em São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre e Salvador

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As transformações do Brasil nos últimos 20 anos passam pelo viés pessoal no documentário Amanhã, do mineiro Marcos Pimentel. As figuras centrais são um trio de crianças que se conheceram, inicialmente, na Barragem Santa Lúcia, em Belo Horizonte – um local que separa uma favela de um bairro de classe média.

O filme começa em 2002 com esse encontro. Os irmãos Christian e Julia conhecem José Thomas. A dupla, moradora de uma comunidade no Morro do Papagaio, visita a casa dele, onde um mundo diferente se abre, repleto de conforto e um certo luxo que não são acessíveis a eles. Duas décadas depois, reencontramos, primeiramente, Júlia, agora adulta e mãe, revisitando na tela de uma televisão as imagens daquele dia. Visivelmente emocionada, assistindo a si mesma e aos amigos, ela define a experiência como maravilhosa.

Pimentel, que tem no currículo filmes como Fé e Fúria e Pele, é um cineasta atento às transformações sociais, geográficas e urbanas. Sem cair em sociologismos baratos, ele faz investigações humanistas que explicitam as contradições sociais do Brasil – e isso fica ainda mais claro em Amanhã. É um filme de um carinho enorme por suas figuras humanas.

Christian, por sua vez, é um menino tímido que pouco aparece diante da câmera. Hoje, sua mãe assiste às antigas imagens e define: “Eles eram felizes, mesmo sem ter videogame e outros brinquedos que toda criança tem”. Na primeira parte do filme, ele ainda cumpre pena na prisão e conversa com a mãe por celular durante as filmagens, contando que está apaixonado por uma moça que está numa outra cadeia. Depois, o vemos de volta à sua casa.

Ao se colocar em primeira pessoa no filme, quebrando a ilusão do processo documental neutro, Pimentel questiona não apenas os parâmetros e a ética do gênero, mas também seu envolvimento emocional com os irmãos. É aflitivo, por exemplo, não apenas para ele, mas também para o público, quando Julia ou Christian desaparecem sem dar notícias.

No meio do filme, um questionamento: onde está Thomas? E Julia e Christian começam a imaginar o futuro do amigo. As possibilidades que cogitam apontam o abismo social que os separa do antigo amigo de classe média. Esse questionamento, afinal, é revelador e permite que o filme seja construído no ritmo dos acontecimentos, aberto ao inesperado. Assim, incorpora em si as mudanças nas vidas das personagens, resultando num retrato vívido, potente e extremamente revelador do Brasil contemporâneo

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