18/02/2025
Documentário

Fé e Fúria

Filmado entre 2016 e 2018, o documentário acompanha casos de intolerância religiosa e racismo, quando evangélicos agridem praticantes de religiões de matrizes africanas em comunidades de Belo Horizonte e Rio de Janeiro. No Sesc Digital (de 15/2 até 15/4/2024)

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Em Fé e Fúria, o documentarista Marcos Pimentel muda o dispositivo de seus filmes, mais conhecidos pelos silêncios e o tom meditativo. O tema aqui pede urgência e dá voz às vítimas de violência e preconceito religioso. Elas são praticantes de religiões de matrizes africanas que foram agredidas por evangélicos física e verbalmente.
 
Filmado em comunidades em Belo Horizonte e no Rio de Janeiro entre meados de 2016 e julho de 2018, o filme capta, de maneira adjacente, um fenômeno que culminou na eleição de Jair Bolsonaro em outubro daquele ano. O documentário investiga o aumento de igrejas e templos evangélicos nesses lugares e como a convivência, até então, pacífica, se transformou numa guerra religiosa desigual.
 
Nesse momento, entre o 1o e 2o turno da eleição presidencial, a religião e as práticas religiosas se tornaram uma questão central na decisão de voto para muitas pessoas. Nesse sentido, o filme de Pimentel se torna ainda mais relevante ao jogar luz num embate injusto e marcado pelo preconceito contra as religiões de matrizes africanas.
 
Uma das figuras mais emblemáticas é Kayllane Campos, que, em 2015, aos 11 anos, levou uma pedrada na rua, no Rio de Janeiro, por estar usando roupas típicas do candomblé. Na época, o episódio foi altamente noticiado, chamando a atenção para a questão da intolerância. Mas as mudanças de lá para cá foram só no sentido do aumento da violência, quase sempre sem punição.
 
Ao mesmo tempo, o documentário mostra uma outra transformação: as facções que governam as comunidades fazem uma guinada para o evangelismo, que se torna uma espécie de religião predominante ali, intensificando a intolerância e a violência.
 
Fé e Fúria também dá voz ao outro lado – não a agressores, pois estes se furtam de falar de seus atos. Uma pregadora que também canta música infantil, vestida de roupas militares, por exemplo, diz que suas canções (pouco ou nada lúdicas, apesar do público-alvo) preparam as crianças para uma guerra espiritual. Por outro lado, há também o depoimento Fabrício Carvalho, um evangélico que usa piercing e repleto de tatuagens, que advoga pela tolerância e a aceitação das diferenças.
 
Este é um filme que retrata as discrepâncias de um discurso falsamente liberal que existe no Brasil – liberal na economia e conservador nos costumes – de maneira exemplar. Com uma pesquisa rica em personagens e situações, Pimentel fez um documentário que nos ajuda a compreender onde chegamos, e pensar em como podemos mudar isso. 
 
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