24/04/2025
Drama

Um Completo Desconhecido

Aos 19 anos, o jovem Bob Dylan chega a Nova York, vindo de Minnesota de carona. Busca encontrar seu ídolo, Woody Guthrie, àquela altura muito doente no hospital. Ainda assim, Guthrie o acolhe e, sob a proteção de Pete Seeger, Bob começa a carreira, encontrando em Joan Baez uma parceira com quem mantém algum conflito. Na Disney+.

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Sem nunca pretender tornar-se uma cinebiografia exaustiva de Bob Dylan, Um Completo Desconhecido, de James Mangold, contempla uma centelha, aquela que deu origem a um mito e o segue até que ele crie asas para sua primeira grande ruptura - nunca a última. Concorrente a oito Oscars, o filme não levou nenhum, mas seu protagonista, Timothée Chalamet, foi o grande vencedor da premiação do Sindicato dos Atores dos EUA.

Inspirado no livro homônimo de 2015 de Elijah Wald, o enredo encontra o jovem Bob (Timothée Chalamet) em 1961, com 19 anos, chegando de carona do Minnesota a Nova York, em busca de seu ídolo, Woody Guthrie (Scoot McNairy) - àquela altura, muito doente, internado num hospital em Nova Jersey.. 

Garoto em começo de carreira, Bob cai nas graças de Woody - que, se não pode mais falar, ainda pode ouvir muito bem e se encanta com as composições folk do recém-chegado. Mais aparelhado para proteger o jovem forasteiro está Pete Seeger (Edward Norton). Músico folk também, melhor amigo de Guthrie, ele abriga Bob em sua casa e compartilha seus contatos no mundo musical, abrindo-lhe caminhos. 

Neste difícil começo, em que Bob circula de um bar para outro, já brilha alto a estrela Joan Baez (Monica Barbaro). A musa folk também não é alheia ao fascínio discreto de Bob e mantém com ele uma relação cheia de altos e baixos, paixão e conflitos.

Outra mulher na vida de Bob é a ativista Sylvie Russo (Ella Fanning), com quem ele mora e mantém um romance e cuja definição, no roteiro, é um pouco infeliz - em todos os sentidos. Inspirada na figura real de Suze Rotolo, cujo nome no roteiro foi mudado a pedido do próprio Bob Dylan - por não se tratar de uma pessoa pública -, Sylvie é um tanto ingênua e dependente, talhando uma figura destinada provavelmente a fazer contraste com a tempestuosa e assertiva Joan. O contraste funciona mas poderia certamente ter sido mais bem delineado no tocante à confecção da personagem de Sylvie.

De todo modo, estas personagens femininas atuam para evidenciar alguma atitude machista do jovem Dylan, naquele momento um bocado autocentrado na própria carreira, em suas composições e desejos, criando a persona artística que atravessaria décadas com músicas como Blowin’ in the Wind, Mr. Tambourine Man, The Times Are A-Changing e tantas outras. E, se há uma qualidade neste retrato do músico é não aparar as arestas de um temperamento reconhecidamente difícil, assim como é inegável sua originalidade e talento.

Thimotée Chalamet encarna seu personagem com voracidade, mostrando ter-se preparado muito para entrar na pele de um ídolo deste quilate sem obscurecer seu lado humano. Ele canta suas músicas com a própria voz e embarca nessa jornada solitária, num certo sentido, de um artista em busca da própria identidade, do próprio rumo - o que, em breve, o levará a um rompimento com o folk, na célebre apresentação no Festival de Newport, em 1965, em que ele recusa continuar rezando apenas por essa cartilha, aderindo ao rock'n'roll e às guitarras elétricas, chocando seus fãs da época mas ampliando seus horizontes a perder de vista. 

Monica Barbaro também compõe uma Joan Baez de personalidade, muito mais afirmativa de uma jovem da época do que qualquer outra, ainda mais sendo, àquela altura, já consagrada como musa folk - e uma musa que nunca se rendeu às pressões comerciais, sempre fazendo o que quis, na música e na vida. Por isso, ela e Bob não podiam ficar juntos muito tempo. Cada um tinha o seu próprio céu para brilhar, embora ele não possa deixar de lhe dever tê-lo levado consigo por todo o país naquele começo de carreira. 

Um coadjuvante com algumas entradas marcantes é Boyd Holbrook, interpretando Johnny Cash - que manteve com Bob uma amizade que os levou a trocarem inúmeras cartas por anos, às quais, no caso das enviadas por Cash, o diretor James Mangold teve acesso, porque Dylan as guardou e compartilhou com o diretor do filme. Mangold, aliás, também dirigiu Johnny e June (2005), uma boa biografia do cantor, interpretado por Joaquin Phoenix, e sua mulher, June Carter (Reese Witherspoon). 

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