20/05/2025

Baseado em história real, filme resgata episódio da ditadura para a juventude atual

O diretor, roteirista e professor Rafael Conde, que assina o longa Zé (Crédito: Divulgação/Bianca Aun)

Cineasta e professor universitário, o mineiro Rafael Conde explica que seu filme
é, em especial, para a juventude de agora, para um público que tem mais ou menos a mesma idade do protagonista, José Carlos Novais da Mata Machado, dirigente da Ação Popular Marxista-Leninista, e que foi morto aos 27 anos, depois de 10 dias de tortura, em 1973, no DOI-Codi de Recife.

“Eram pessoas muito jovens com ideais muito sérios. Acho importante resgatar essas histórias para a juventude de hoje, e mostrar a eles os horrores da ditadura, pois não é raro jovens defendendo a ditatura”, conta o diretor em entrevista ao Cineweb.

Conde, que assina o roteiro com Anna Flávia Dias, parte do livro-reportagem de Samarone Lima. \Ele explica que seu filme tem ao centro a questão da impossibilidade da fala, da necessidade de viver escondido, um aspecto que o filme leva para sua forma, com uma câmera estática que enquadra personagens um tanto distantes um do outro. “Filmamos na época da pandemia, e era uma necessidade se fazer assim. Ms, no fundo, acaba tendo a ver com o que se está scontando, com o distanciamento entre os personagens.”

O cineasta, que tem no currículo filmes como o longa Fronteira, baseado em Cornélio Penna, e o famoso curta A hora vagabunda, passou cerca de duas décadas trabalhando em Zé, enfrentando diversos percalços ao longo dos anos para conseguir realizar seu filme. Chegou mesmo a acreditar que não seria possível fazer o longa no governo de Jair Bolsonaro.


Caio Horowicz, em cena do filme (Crédito: Divulgação)

Para preparar o elenco, em especial os mais jovens, como Caio Horowicz, que interpreta o protagonista, Eduarda Fernandes, que faz Bete, companheira de Zé, e Samantha Jones, que faz a militante Maria do Socorro, Conde contou com oficinas e palestras ministradas por Cecília Boal, viúva de Augusto Boal (criador do Teatro do Oprimido), o historiador Bernardo Novais da Mata Machado, irmão de José, e a própria Maria do Socorro, cujo codinome, na época, era Grauninha.

“Fizemos uma busca incessante na criação desses personagens para ter muita proximidade das figuras reais. Eu acho importante demais sempre mostrar os resquícios da ditadura que ficam até hoje.”

A história de José Carlos é bastante conhecida em Belo Horizonte, especialmente pelo fato de haver uma traição dentro da família. Foi seu cunhado quem colaborou com a prisão do militante em Recife. Zé era filho do renomado jurista Edgar da Mata Machado, deputado pela UDN e um dos fundadores da Faculdade Mineira de Direito, e de Yedda Novaes da Mata Machado.

“O Zé vinha de uma família importante, de várias gerações de intelectuais. Seu pai também era odiado pelos militares por denunciar a tortura e reunir advogados que defendiam presos políticos. A tortura do filho foi, também, uma vingança contra o pai”.

Combinando a atividade de cineasta com a de docente, Conde conta que seus filmes também se transformam em projetos de pesquisa para seus alunos. Conde começou sua relação com o cinema no movimento cineclubista, e hoje é professor pesquisador do Departamento de Fotografia e Cinema da Escola de Belas Artes da UFMG. Há mais de 20 anos está em contato cotidianamente com os jovens e percebe que nas gerações atuais existe uma inquietação política muito forte.

“O movimento estudantil contemporâneo conquistou muitas coisas, como a mobilização dos secundaristas em 2016. É muito bonito ver a força da juventude em suas lutas, suas demandas. É uma utopia, a busca por um país melhor que a gente espera que não passe conforme eles envelheçam.”