Com muito sangue e poeira, entre armaduras e espadas, cavalos e tigres, o diretor inglês Ridley Scott fez a mágica que muitos consideravam impossível: ressuscitou o épico no Império Romano, que muitos julgavam definitivamente enterrado. Sob sua batuta, em Gladiador, é como se Mad Max encontrasse Blade Runner num túnel do tempo, criando uma aventura cheia de energia e honra na arena do Coliseu, no ano 180 d. C. A mágica funcionou tão bem que o filme tornou-se um estrondoso sucesso de bilheteria em todo o mundo e faturou 5 Oscar - melhor filme, ator (Russell Crowe), figurino, som e efeitos visuais.
Uma façanha deste tipo era considerada improvável desde o surgimento do grosseiro Calígula (1980), o momento mais baixo de um gênero que consagrara clássicos como Ben-Hur (1959). De Calígula, felizmente, a história de David Franzoni (roteirista de Amistad) teve a prudência de se afastar, só lhe tomando emprestada uma vaga alusão ao incesto entre o imperador Commodus (Joaquin Phoenix) e a irmã, Lucilla (Connie Nielsen) - que aqui não se consuma. No mais, o filme se apóia nos vigorosos ombros do neozelandês Russell Crowe, 36 anos, recém-saído de uma indicação ao Oscar de melhor ator como protagonista de O Informante.
Na pele do general Maximus, Crowe combina a energia física de um Arnold Schwarzenegger com o sex-appeal de um Mel Gibson (este, aliás, o primeiro nome cogitado para o papel), aliados a uma modulação de voz que não fica nada a dever ao Marlon Brando dos bons tempos. Do alto dessa estrutura, o ator comanda um espetáculo sangrento, mergulhando na trajetória de um orgulhoso comandante das legiões romanas, indicado pelo imperador Marco Aurélio (Richard Harris) para ser seu sucessor, já que não confia no filho, Commodus. Atropelados por um complô, sucumbem Marco Aurélio, assassinado, e o general, que tem sua família morta e é capturado como escravo.
No circo de gladiadores do ambicioso Próximo (Oliver Reed, que morreu durante a filmagem), Maximus ressurge das cinzas como o Espanhol, ídolo das massas que acorrem às arenas, e aí tem sua chance de vingança. Crowe extrai o máximo de sua interpretação, mostrando-se um ator-camaleão, desses que se transfiguram num papel e nunca tem o mesmo rosto de um filme para outro. Em O Informante, ele aparecia envelhecido, sob o peso de um enorme dilema ético e 20 kg a mais. Aqui, ele ressurge rejuvenescido, atlético e feroz, quase como o policial truculento e apaixonado que interpretou em L.A. - Cidade Proibida. Essa versatilidade, que combina o físico de um herói de ação com um intérprete capaz de transmitir vulnerabilidade e ternura, vem tornando Crowe uma das apostas mais consistentes em Hollywood. Tudo indica que aqui nasce um novo astro, apesar da fama de ser tão bom de copo e de briga nas telas quanto fora delas.
Na superprodução, que custou US$ 103 milhões de dólares e exigiu a construção de uma réplica do Coliseu na ilha de Malta, o ponto fraco ficou na conta de Joaquin Phoenix. Perdendo feio na comparação com tantos atores veteranos e competentes, como Crowe, Harris, Reed e Derek Jacobi, o irmão do etéreo River Phoenix não consegue superar o registro de um eterno bebê chorão. Verdade que seu papel também foi mal delineado no roteiro - afinal, essa história de atribuir-lhe tamanha perversidade e fraqueza de caráter só porque o pai não o amava soa como psicologia de almanaque.