Filme policial com generosas doses de humor negro, O último prosecco, de Antonio Padovan, parte do livro de Fulvio Ervas para criar uma trama ambientada nos arredores de Treviso, norte da Itália.
Na primeira parte, impõe-se a presença carismática do conde Desiderio Ancilotto (Rade Serbedzija), descendente de uma tradicional família produtora de fino prosecco na região de Valdobbiadene, cuja imensa propriedade e vinhas já viveram melhores dias. Seu encontro com uma jovem misteriosa (Silvia D’Amico) pressupõe não só uma despedida como um plano. Nessa mesma noite, o conde se encaminha ao cemitério local e amanhece morto.
A investigação aponta para um suicídio, cujas causas permanecem obscuras. Pouco mais do que esclarecer estes motivos parece a única missão à vista do novo inspetor, Stucky (Giuseppe Battiston), que acaba de ser promovido, na iminência da aposentadoria do chefe (Roberto Citran). A ocorrência de uma outra morte, desta vez, sem dúvida, um assassinato, transforma a investigação numa jornada cheia de reviravoltas para o pachorrento inspetor.
A figura de Stucky, um solitário gordinho, que mora com um tio (Babak Karimi), oferece, de saída, um desvio do tradicional perfil do policial. Este aqui parece muito quieto, até inseguro, com uma história familiar problemática e ostentando uma deselegância discreta que o faz também notável.
O filme extrai seu sabor do retrato do ambiente da cidadezinha onde moravam o conde e o primeiro morto - ao qual não tarda a somar-se um terceiro, criando novas pressões sobre o inspetor. Nesta aparentemente bucólica localidade, cercada de prados e vinhas verdejantes, há anos instalou-se uma cimenteira que, se trouxe mais dinheiro à região, acarretou problemas ambientais. Por conta disso, travava-se uma guerra aberta do falecido conde contra a cimenteira, encerrada por laudos que desmentiram suas alegações sobre a poeira derramada sobre os vinhedos.
Diretor estreante aqui, Antonio Padovan dispõe com habilidade de sua galeria de personagens da cidadezinha, como Isacco Pitusso (Teco Celio). Tido como um velho louco inofensivo, ele cumpre diariamente um ritual, limpando sempre os mesmos túmulos no cemitério e conversando com estes mortos que ele parecia conhecer muito bem - inclusive o recém-falecido conde. A misteriosa moça da primeira sequência, Francesca Beltrame, fará também uma nova entrada em cena, assim como Adele (Gisella Burinato), a onipresente velha governanta do conde, e Celinda (Liz Solari), a filha do conde que viveu toda a vida longe, é sua única herdeira e a última a entrar no imbróglio.
A própria aparente falta de jeito de Stucky para lidar com um quebra-cabeças desafiador é, no entanto, um trunfo numa história que pisca um olho para a ironia, outro para as lealdades que se podem formar em situações ambíguas.