Primeiro filme baseado na popular série de mangás de Muneyuki Kaneshiro, Blue Lock: episódio Nagi se inspira no tédio existencial de dois adolescentes do ensino médio, Nagi Seishiro e Reo Mikage. Mas é justamente esse tédio que irá unir os dois numa trajetória alucinante no futebol - um tema traumático num Japão que viu sua seleção passar por vexame em 2018.
Justamente é a vontade de superação desse vexame que nutre Blue Lock, um projeto de treinamento super-intensivo, comandado pelo técnico Jinpachi Ego - e esse nome não é mera coincidência. Aliás, tudo aqui é movido, ou tenta ser, pelo egoísmo, pelo salve-se quem puder.
De um modo ou de outro, Nagi e Reo acabam engajados no projeto, que une 300 jovens que, como eles, mostraram talento excepcional no futebol - Nagi, um tanto a contragosto, superando uma quase invencível preguiça pela insistência do amigo Reo, um jovem milionário que teve tudo fácil na vida e enxerga no desafio esportivo uma motivação excepcional.
Acontece que dentro do Blue Lock a concorrência é mais do que feroz. Tudo naquele ambiente segregado, isolado das famílias dos jogadores e da sociedade lá fora, conspira para que eles dêem o máximo e se superem sem descanso, em busca de se tornarem o centroavante-referência que leve, finalmente, a seleção japonesa a conquistar sua Copa do Mundo.
O clima lá dentro lembra uma espécie de Jogos Vorazes sem morte. Cada jogo entre duas equipes é uma luta desesperada de vencer, em que o desanimado Nagi parece não encontrar realmente sentido - ele olha a paixão e o esforço dos outros como se estranho a tudo aquilo, sustentado unicamente pela devoção a Reo, que ele encara como o primeiro a não olhá-lo com estranheza. Reo, na verdade, enxerga em Nagi um parceiro ideal no jogo, alguém dotado de uma incrível capacidade física mas a que falta uma centelha para se esforçar mais.
Nesse quadro, entram diversos outros jogadores, adolescentes do ensino médio como eles, mas identificados cada um à sua maneira com a disputa - cujas proezas físicas lembram inapelavelmente o universo do videogame e essa é mesmo a intenção. Mas a animação, dirigida por Shunsuke Ishikawa, se de um lado expõe sem rodeios esse clima de competição implacável não deixa de abrir alguns respiros para refletir sobre o valor da amizade e as dores do crescimento, sem aquele clima adocicado de tantas aventuras juvenis hollywoodianas.
Nagi, afinal, é um anti-herói com que muitos adolescentes podem identificar-se, desmotivados para tudo na vida mas encontrando, a custo, um caminho para entusiasmar-se por alguma coisa, no caso, o esporte.
Pode-se ressentir de ser um universo exclusivamente masculino, o que lhe dá uma certa temperatura monotom e aqui sem nenhuma referência direta à sexualidade. Mas isso deve ter o seu público, particularmente nos devotados fãs da série.