Vencedor do prêmio de melhor ator revelação para Ricardo Teodoro na 63ª Semana da Crítica de Cannes, em 2024, Baby, de Marcelo Caetano, narra a história de uma amizade cheia de desencontros e paixão. Quando o jovem Wellington, que depois se tornará Baby (João Pedro Mariano), deixa o Centro de Detenções em São Paulo sem o apoio da família biológica, que desapareceu, é acolhido por Ronaldo (Ricardo Teodoro), um garoto de programa. Depois, Priscila (Ana Flavia Cavalcanti), a ex-mulher de Ronaldo e mãe de seu filho, e sua parceira Janaína (Bruna Linzmeyer) abrem as portas de sua casa para que Baby possa se encontrar em uma nova família. Mas nenhum desses caminhos será pacífico, já que as procuras de Baby são muitas e contraditórias, num processo de crescimento tumultuado.
O centro velho de São Paulo é um personagem essencial como cenário para estas relações humanas, incorporando inclusive alguns habitantes reais deste lugar, quase uma cidade dentro da cidade, e onde, aliás, o diretor mora, na lendária avenida São João imortalizada por Caetano Veloso. Caetano, aliás, foi outro habitante provisório, de passagem, deste lugar de migração, de pessoas que não nasceram na cidade e entre as quais brota de tudo, inclusive, amor.
A relação entre Ronaldo e Baby, que são pessoas de gerações diferentes, é o termômetro da voltagem humana do filme, que se move entre seus muitos conflitos e contradições, num universo de erotismo masculino e homossexual, em que a luta pela sobrevivência é acirrada e cruel. Não só pela precariedade econômica como pela batalha constante com a violência policial desmedida, um elemento da realidade de São Paulo que tem se tornado cada vez mais urgente e que o filme faz bem de incorporar.
Como em Corpo Elétrico (2017) seu longa de estreia, o grande feito do cinema de Marcelo Caetano é dar forma à complexidade da relação entre Ronaldo e Baby sem procurar destruí-la com alguma espécie de acomodação, de pacificação. Todos os sentimentos e as procuras de cada personagem explodem, do Ronaldo com um acúmulo de vivências dolorosas que deixaram marcas e de Baby ainda imaturo, e em busca de uma família que o abandonou. Até a percepção da sexualidade de cada um é muito distinta, confluindo para conflitos que não lhes tiram um pingo de intensidade, bem ao contrário. O cinema de Marcelo Caetano habita uma esfera que não se detém na fronteira das coisas, antes, vai além delas, olhar o que está do outro lado, seja lá como for. E também para mostrar que apesar de tudo existe, sim, amor em SP.