Roney Villela e Endi Vasconcelos, em cena de A morte habita à noite (Crédito: Divulgação)
“O curta é uma corrida de 100 metros e o longa, uma maratona imprevisível”. Assim define Eduardo Morotó sua estreia em longa, A morte habita à noite, que parte de seu premiado curta Quando morremos à noite, de 2011. Ele conta que o novo filme aconteceu muito por acaso. O outro filme partia de um conto de Charles Bukowski, A mulher mais bonita da cidade, e era mais sensorial. Agora, ele queria fazer algo mais próximo de atores.
O curta foi exibido em festivais, ganhou prêmios e chamou a atenção do produtor Leonardo Mecchi, que convidou Morotó para transformá-lo num longa. “Então pudemos fazer um desdobramento do personagem, aprofundar situações. Mas é um desafio, pois leva anos. Um curta, a gente faz com os amigos em algumas semanas. Eu comecei a escrever esse roteiro em 2013 e estamos lançando só em 2022. De qualquer forma, foi uma experiência muito boa.”
Os dois filmes trazem Roney Villela como Raul, um homem que vive na periferia de Recife, e seu relacionamento complicado com mulheres, sempre em busca de alguém para estar ao seu lado, espantar a solidão, dar um rumo na vida. Morotó partiu, dessa vez, de diversos personagens de Bukowski. “Agora eu queria falar da mulher do conto e, nesse sentido, o filme é muito livremente inspirado no texto. Eu queria mesmo era captar o universo do escritor.”
Para o diretor, as personagens são figuras que habitam a escuridão e, para trabalhar as personagens femininas, foi fundamental a participação das atrizes centrais do filme – Mariana Nunes, Rita Carelli e Endi Vasconcelos. “Foi uma construção em conjunto, antes mesmo de filmarmos. Procuramos as personagens, a intimidade entre elas e o Raul. Elas tinham muita noção de que o longa dialogava com a decadência do curta, mas também havia a necessidade da transformação.”
Villela, que foi premiado no Cine Ceará por esse trabalho, era uma espécie de ídolo de infância de Morotó. “Eu o via nas novelas. Depois o conheci quando trabalhou numa peça com um amigo meu, que o indicou para o curta. Ele era o ator ideal”. Os dois se transformaram em grandes parceiros. “Ele trouxe muito para o filme, a energia da simplicidade, a construção dos diálogos. O longa é fruto da confiança que tenho nele.”
Morotó explica ser fruto das políticas de incentivo ao cinema do primeiro governo do presidente Lula, o projeto Revelando Brasis, que, em 2006, incentivava a produção cinematográfica em cidades de até 20 mil habitantes. “Depois ainda consegui uma bolsa de estudos para cursar cinema. Se não fosse isso, provavelmente, eu não conseguiria trabalhar com cinema.”
A morte habita à noite, para o diretor, que também assina o roteiro, tem muito de Brasil. “Nas capitais, cidades grandes, tem muitas dessas figuras marginalizadas, como no filme. E a minha intenção era colocar o público dentro desses lugares.” E acrescenta: “É um cotidiano sombrio, não é uma fantasia, é a realidade de milhões de brasileiros que vivem na extrema pobreza. Além disso, acredito que ele desperta um sentimento de reconhecimento e compaixão entre essas figuras.”