Filme de abertura do Festival de Cannes 2023, o drama de época de Maïwenn passou por lá já marcado por escândalos. Naquele momento, polêmicas envolviam a própria atriz e diretora - Maïwenn teria cuspido num jornalista - e seu protagonista, Johnny Depp, acabava de sair de um longo e tóxico processo envolvendo sua ex-esposa, Amber Head, que ele venceu. Enfim, prato cheio para a mídia de fofocas, mas o que interessa é o filme - que é apenas razoável.
Verdade que tem qualidades. A Favorita do Rei resgata uma personagem histórica intrigante do século XVIII, amante do rei Louis XV (Johnny Depp) e faz, até certo ponto, um bom serviço. O filme tem uma produção refinada, filmado em Versalhes, com os melhores figurinos e penteados, e injeta uma certa ironia quando lança um olhar sobre os rituais da corte francesa da época que ajuda a sacudir aquela poeira que não raro recobre as produções históricas.
Nos melhores momentos, o filme de Maïwenn deixa entrever o quanto aquela mulher, filha sem pai de origem pobre, não tinha lugar no mundo, embora não lhe faltassem inteligência nem energia. Teve, assim, que contar com seus talentos eróticos, tornando-se prostituta, depois amante do conde du Barry (Melvil Poupaud) - que finalmente tornou-se seu cafetão e fez de tudo para apresentá-la ao rei. Com o rei, no entanto, Jeanne pôde viver um grande amor, em tudo prejudicado pelas convenções da época.
Um grande achado nos personagens secundários é a figura de La Borde (Benjamin Lavernhe), o valete do rei que intermedia a convivência da amante com o soberano e conhece todos os meandros desta corte altamente hipócrita. O ator rouba a cena em diversos momentos, em registros que vão do cômico ao mais emocionado.
Dito isso, é de se pensar se Maïwenn era a diretora ideal para extrair desta história todo o seu potencial e também se deveria ter sido ela a intérprete de Jeanne na maior parte do tempo. E a resposta seria não nos dois casos. Muito festejada na França, ela tem no currículo um Prêmio de Júri para seu primeiro filme como diretora, o regular Polissia (2011), além de conquistar um prêmio de melhor atriz para Emmanuelle Bercot em seu segundo filme, Meu Rei (2015). Mas toda essa celebração parece um tanto desproporcional. No máximo, até aqui ela mostrou-se uma atriz e diretora bastante mediana, nada mais. E este tipo de história precisava do talento digamos de uma Jane Campion para realmente ser marcante.
Quanto a Johnny Depp, ele se sai até melhor do que o esperado na pronúncia do francês - afinal, foi casado com uma francesa, Vanessa Paradis -, embora sua atuação nunca seja mais do que mediana também. Parece que Maïewnn o escolheu mesmo para repetir algumas das caretas de seu personagem mais celebrado, o pirata Jack Sparrow.