Cacá, um bravo cineasta brasileiro
Um dos últimos expoentes do Cinema Novo, Cacá Diegues atravessou trabalhando como diretor e produtor seis décadas de cinema brasileiro: tarefa para os fortes, num cenário marcado por uma ditadura militar, o fechamento da Embrafilme, a reconstrução democrática do País e da indústria cinematográfica e inúmeros embates culturais, ideológicos e mercadológicos.
De fala macia e espírito indomável, o cineasta alagoano radicado no Rio de Janeiro incorporou em seus muitos filmes a marca de um País sacudido por toda essa turbulência, por toda essa quase sina, que ele sempre acreditou superável, de tudo destruir, de tempos em tempos, para recomeçar do zero. Tudo isso sem perder a ternura jamais.
Os personagens de Cacá, em filmes como Chuvas de Verão (1978), Dias Melhores Virão (1989) e Um Trem para as Estrelas (1987), sofrem, amam e acreditam. Sem ingenuidade nem perfeccionismo, todos humanos, fundamentalmente humanos, assim como o inesquecível trio da Caravana Holiday de Bye, Bye Brasil, talvez seu filme mais simbólico de tudo que o Brasil é, foi e podia ser.
A presença incontornável do negro na realidade e no imaginário do País nunca lhe escapou, povoando filmes como Ganga Zumba - selecionado para a Semana da Crítica de Cannes em 1964, ano em que Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha, e Vidas Secas, de Nelson Pereira dos Santos, disputavam a Palma de Ouro -, Xica da Silva (1976), Quilombo (1984) e Orfeu (2003). E a vontade de rir enquanto pensava o Brasil igualmente não o abandonava, como em Deus é Brasileiro (2003), um grande sucesso cuja sequência Cacá filmou mas ainda não havia finalizado.
Fora seus inúmeros filmes, que fizeram a ponte entre o Cinema Novo e tudo o que se lhe seguiu, Cacá permaneceu sempre como um intelectual, no sentido de pensar o cinema brasileiro e de defender a afirmação de sua singularidade no mundo, ao mesmo tempo que atento e engajado para tornar o cinema tão popular quanto possível. Sua imensa generosidade para com quem entrava depois dele no barco desse cinema nacional também fica na memória. Que Cacá seja sempre lembrado por tudo isso.
Crédito da Imagem: @abletras_oficial