Aruanda destaca novos expoentes do cinema paulista
- Por Neusa Barbosa
- 02/12/2023
- Tempo de leitura 3 minutos
João Pessoa – A primeira noite competitiva do Fest Aruanda teve uma marca paulistana, com a passagem de dois longas:
Citrotoxic, de Julia Zakia, que enfoca a questão ambiental através da história de uma mãe (Bianca Joy) e uma filha (Luiza Zakia O. Leblanc), sofrendo os efeitos de agrotóxicos, aplicados por um trabalhador rural (Jerry Gilli) que não tem consciência dos efeitos que também sofre; e Saudosa Maloca (foto), de Pedro Serrano, em que o diretor expande o tema de seu premiado curta Dá Licença de Contar (2015), retratando o universo do cantor e compositor Adoniran Barbosa (Paulo Miklos) e suas interações com os amigos Joca (Gustavo Machado) e Mato Grosso (Gero Camilo) pelas ruas do Bixiga, ameaçado, em sua época como agora, pela insaciável especulação imobiliária.
A própria sessão de Saudosa Maloca, numa sala do Manaíra Shopping, foi uma constatação de como a música de Adoniran atravessa regionalidades, com parte da plateia local se antecipando ou cantando junto algumas letras das impagáveis canções, cujas letras misturam um sotaque italianado e caipira típico de São Paulo, como a própria "Saudosa Maloca".
O diretor do filme, porém, optou mais por revelar a poética e as circunstâncias retratadas nas letras dessas músicas do que propriamente em exibir interpretações de muitas delas – caso da famosa "Trem das Onze", que não é tocada no filme. A ficção coloca ao centro um Adoniran (Paulo Miklos) mais velho, recordando suas aventuras/desventuras com dois inseparáveis companheiros de sorte, Joca (Gustavo Machado) e Mato Grosso (Gero Camilo), pelas ruas e bares do Bixiga dos anos 1950. No debate do filme, Serrano explicou a razão de ter optado por uma relativa contenção musical: “O que virava dramaturgia, não virava música, para não virar foto-legenda”. Ele admite que parte do público poderá sentir falta de uma composição ou outra, mas que queria provocar essa sensação de “quero mais”. O que, pela sessão de ontem aqui na Paraíba, ficou claro que aconteceu.
Famílias contra o veneno
Já em Citrotoxic, a diretora Julia Zakia, uma experiente e premiada diretora de fotografia, o foco ficcional recai sobre uma mãe aeromoça (Bianca Joy Porte) e uma filha (Luíza Zakia O. Leblanc) de São Paulo. A menina tem problemas respiratórios e a mãe, a conselho médico, viaja para um sítio no interior com ela. Numa propriedade vizinha a uma grande plantação de laranjas, as duas são confrontadas com uma massiva aplicação de agrotóxicos, executada por um trabalhador rural (Jerry Gilli) que não tem consciência da gravidade dos efeitos do produto. Esse confronto de universos, o urbano e o rural, o afetivo e o desprezado, ressalta na cuidadosa fotografia do filme, que procura, sem rodeios, colocar seu engajamento a favor de uma maior preocupação com a proteção do meio ambiente, da natureza e da saúde. A própria diretora ressaltou não ter se preocupado em esconder os rótulos de diversos pesticidas cuja aplicação ela realmente filmou – essa é uma parte documental do filme.“A gente até teve alguma preocupação em não nos tornarmos tão panfletários, mas isso nem foi assim tão forte. A gente queria mostrar mesmo que estão matando o planeta”, observou no debate.
Acima, a diretora Júlia Zakia (esq) e a atriz Bianca Joy Porte, do filme "Citrotoxic"
Crédito da imagem: Neusa Barbosa
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