08/02/2025

Festival de Vitória celebra Suely Bispo e pratas da casa

Vitória - O festival celebrou em sua noite de abertura os talentos locais, unindo a homenagem capixaba à atriz e escritora Suely Bispo à exibição de quatro curtas e um longa produzidos no estado - salientando o caráter de fomento que o festival, de 31 anos, tem e todo festival deve ter.
A homenagem a Suely Bispo, uma atriz com farto currículo no teatro, cinema e televisão (como a novela Velho Chico), além de uma sólida obra literária como poeta, teve o efeito de produzir uma descoberta, ou redescoberta, já que seu nome não é tão conhecido quanto deveria fora das divisas do Espírito Santo. No entanto, a atriz deve ter seu nome inscrito com mais ênfase entre as pioneiras da representatividade negra, especialmente pelo trabalho na representação teatral de textos de Marlowe, Goethe e Shakespeare, em peças como Shakespearianas (1998/2004) e Fausto (1995), em que na época era mais do que raridade cogitar um elenco negro. Ela mesma é modesta quando indagada sobre esse aspecto: “Eu nem pensava nisso (em pioneirismo) na época. Eu simplesmente quis fazer e fiz”, relatou, em entrevista coletiva na tarde de ontem.
Mas hoje, bem consciente do percurso percorrido, em que se insere a publicação de livros como "Resistência negra na Grande Vitória: dos quilombos ao movimento negro" - resultado de sua formação como historiadora -, ela não se esquece de homenagear as pioneiríssimas Ruth de Souza e Léa Garcia, e defender maior profissionalização e direitos para os atores.

Amostra diversificada

Na programação dos filmes, o que se viu foi uma amostra muito diversa em estilos. O longa da noite foi o documentário Presença (foto ao lado), estreia no formato de Erly Vieira Jr. e que se sustenta em torno do trabalho fortemente visual de três artistas, atuantes no Espírito Santo, que usam seus corpos e elementos naturais e objetos para dar vida a uma obra em que a reinvenção da corporalidade é central como forma de expressão.
Os artistas são Marcus Vinicius, que é visto em contato com várias paisagens ao redor do mundo, entre pedras, plantas e animais, inserindo-se como mais um corpo em contato com todos esses elementos; Rubiane Maia, que se vale de vários recursos e técnicas, começando por plantar um jardim num trecho do Sesc Pompéia em S. Paulo; e Castiel Vitorino Brasileiro, que funde o que define como experiências de cura, como psicóloga, macumbeira e artista, para produzir performances profundamente sensoriais, como uma sequência em que ela dança acompanhada pelo batuque afro do pai, Augusto Brasileiro.

É o tipo do filme que desafia descrições, porque se trata de uma experiência que apela aos sentidos, ainda que Rubiane e Castiel, que exibiram suas obras na mais recente Bienal de São Paulo, sejam bastante eloquentes nas explicações sobre os rumos tomados em sua atuação artística. Nem por isso a tarefa de acompanhar a proposta do filme deixa de ser exigente, demandando do espectador um engajamento quenem todos talvez disponham - mas a intenção de propor é bem-vinda e as ferramentas cinematográficas são bem utilizadas a favor de suas intenções, como a fotografia de Ursula Dart e o desenho de som de Marcus Neves, também co-autor da trilha sonora, ao lado de Gimu.

O longa, aliás, tem estreia nos cinemas prevista para o dia 1° de agosto.

Curtas

Da mesma forma, os curtas da noite percorreram caminhos distintos. O T-Rex e a Pedra Lascada, do estreante Luã Ériclis, recorre a uma expressiva presença de crianças e o uso de animação para revisitar a lenda sobre o espírito guardião de um dinossauro adormecido na raiz de uma árvore à beira de um rio. Fala vô!, de Felipe Risallah, da mesma forma usa os recursos da animação 3D para descrever a relação especial entre o jovem diretor e seu avô durante a pandemia.

Os outros dois curtas foram documentários ligados à questão ambiental. Mulheres Maratimbas, de Thais Helena Leite, valoriza a presença de um quinteto de senhoras da terceira idade, pescadoras artesanais e atuantes na vila de Porto Grande, em Guarapari, defendendo a proteção à lagoa Maembá. E O Caboclo do Sapê, de Ricardo Sá, focaliza o personagem do Caboclo Sapezeiro, nome artístico de Antônio Rodrigues, que usa sua arte musical na luta pelo resgate e recuperação de terras degradadas pelo plantio de eucaliptos numa região quilombola.