07/09/2024

A força da dança negra baiana seduz o Cine PE


Recife – A Bahia chegou com tudo na noite desta quinta (7/9) na competição do Cine PE, em que o ótimo documentário Ijó Dudu, Memórias da Dança Negra da Bahia", de José Carlos Arandiba “Zebrinha”, resgata figuras fundamentais da dança brasileira, que atuaram na Bahia a partir dos anos 1960.

João Carlos Arandiba "Zebrinha", diretor do documentário baiano "Ijó Dudu, Memórias da Dança Negra da Bahia"

Mais conhecido como jurado técnico da Dança dos Famosos, na tevê, mas na verdade um veterano bailarino, professor e coreógrafo que carrega uma imensa trajetória artística vivida muito tempo fora do Brasil, “Zebrinha” entrevista artistas que muitos não conhecem, como Amazonas, Conga, Senzala, mestre King, Nadir Nóbrega, Clive Morgan e vários outros talentos da dança negra baiana, com atuação desde os anos 1960, trazendo depoimentos que ilustram não só o trabalho de cada um como também o apagamento promovido pelo racismo – que o filme certamente contribui para enfrentar. Ijó Dudu, aliás, significa “corpo preto”.

Na coletiva do filme, hoje (8/9), “Zebrinha” – com o é carinhosamente conhecido – contou que sua idéia inicial era coletar depoimentos destes profissionais da dança, muitos dos quais foram seus contemporâneos ou seus mestres, para evitar justamente que se perdesse a memória de sua atuação – que não consta dos livros ou de registros sobre a dança negra baiana.

Posteriormente, conseguiu um financiamento inicial da Fundação Pedro Calmon, depois outros apoios que lhe permitiram chegar ao filme – que, espantosamente, como ele destaca, “é o primeiro documentário sobre estas pessoas”. O filme vem bem a tempo, porque algumas pessoas desta geração morreram, outras, como destaca “Zebrinha”, “simplesmente desapareceram, ninguém sabe onde andam”. Ou seja, “havia urgência de contar esta história”, ele ressalta.

Uma ausência que se sente é de imagens mostrando os personagens do filme dançando. Mas o diretor explica que “não há registros fílmicos fora dos que eu apresento”. Há poucas imagens em movimento, mesmo de TV, algumas fotos e só.

A própria circulação do documentário, entretanto, tem potencial de causar incômodos, já que vários profissionais ouvidos relatam episódios de discriminação sofridos em escolas baianas, como a tradicional Ebateca, de Salvador, por exemplo. Diz “Zebrinha”: “A Ebateca está em polvorosa (com o meu filme). Mas a verdade é que, até hoje, quando surge por lá um menino ou menina negros e talentosos, eles me ligam: ‘Tenho um menino/menina pra você aqui”. Isto, segundo ele, significa que “a escola até hoje não pensa que o lugar deles é lá”.


Luto e perdas
Foi uma noite especialmente feliz, no sentido artístico, também nos curtas-metragens, caso de Céu, de Valtyennya Pires (PB), sobre uma famosa ceramista que deixou um legado na Serra do Talhado; Eu nunca contei a ninguém, de Douglas Duan (PE), uma animação de belo conteúdo e técnica sobre a morte vista de um ponto de vista infantil; Filhos Ausentes, de Virgínia Guimarães e Jansen Barros (PE), sobre o êxodo e a necessidade de voltar à terra natal; e Fossilização, de João Folharini (RJ), uma abordagem original do luto traduzido numa conversa entre uma neta (Alanne Figueiredo) e uma avó (Ju Colombo).

Debate dos curta-metragistas: Valtyennya Pires à esquerda, do curta "Céu"

Crédito: Neusa Barbosa