07/02/2025
Suspense Drama

Carvão

Irene e seu marido, Jairo, têm uma pequena carvoaria no quintal de casa, numa cidade do interior. Quando surge a proposta de hospedar um estrangeiro em sua casa, ela fica tentada, por conta do enorme valor em dinheiro que receberiam. Mas, antes disso, uma atitude drástica precisa ser tomada, dando início a uma espiral de mentiras e violência.

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Primeiro longa da premiada curtametragista Carolina Markowicz, Carvão impressiona pela sua segurança na direção. Pode-se não concordar com todas as escolhas da cineasta, mas é inegável que todas elas foram feitas muito seguramente, com pulso muito firme na condução de uma trama difícil, marcada por personagens complexos e de uma assustadora ambiguidade moral.
 
Nesse sentido, o roteiro – também assinado por Markowicz e premiado no Festival do Rio – é revelador de uma realidade contemporânea brasileira, marcada pela moral facilmente fluida que se ajusta conforme os desejos e interesses de um momento. Carvão talvez seja um dos filmes mais potentes sobre esse Brasil de 2022, tamanha a força que traz em si.
 
A protagonista é Irene (Maeve Jinkings, grande como sempre), que mora numa pequena cidade do interior marcada por seu conservadorismo.  No quintal de casa, ela mantém uma pequena carvoaria com o marido, Jairo (Rômulo Braga, à altura de Maeve em cena). Eles têm um filho pequeno, Jean (Jean Costa, um achado), tagarela e esperto. O pai dela, no entanto, está doente, na cama, não fala, não ouve, mas todos os meses a família recebe a visita de uma agente de saúde, interpretada por Aline Marta, merecidamente premiada como coadjuvante no Festival do Rio.
 
Numa das visitas, ela traz uma proposta inusitada, mas muito rentável: esconder um forasteiro em sua casa, Miguel, interpretado pelo argentino César Bordón. Para que isso ocorra, no entanto, um ato ilícito – na verdade, mais do que isso, moralmente condenável – precisa ser feito. Se Irene hesita um pouco, logo aceita – o dinheiro é alto e bem-vindo.
 
Markowicz arma a partir disso uma investigação da falsa moral vigente no Brasil e não poupa – como mostra a impressionante cena final – ninguém. A fluidez dos interesses molda as ações e os personagens, que surpreendem em seus caminhos e como se vendem de maneira tão fácil e barata. Há, em alguns momentos, ações que não são tão bem resolvidas quanto outras, mas, no geral, a narrativa caminha muito bem, seguindo pessoas que vivem na corda bamba. Outra grande qualidade é que o filme não se coloca acima de seus personagens – ele não os julga. São pessoas comuns fazendo coisas incomuns – muitas vezes horríveis.
 
Um elenco menos afinado – o filme inclui ainda Camila Márdila e Pedro Wagner – não seguraria o peso da trama e a complexidade dos personagens. Markowicz revela-se excelente na direção de atores também, equilibrando todos e todas num mesmo nível – são particularmente boas as cenas de Maeve com Jean. E com seu diretor de fotografia, Pepe Mendes, compõe um filme claustrofóbico que parece sempre coberto por uma fuligem – mas não é da carvoaria, é de pessoas que tentam esconder o que fazem.
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