Júri de Cannes decepciona ao não consagrar drama iraniano
- Por Neusa Barbosa, de Cannes
- 25/05/2024
- Tempo de leitura 2 minutos
Cannes - Afinal, a premiação do 77° festival foi marcada por uma grande decepção, no sentido de não premiar o grande e merecido favorito, o drama político iraniano The seed of the sacred fig, de Mohammad Rasoulof, para quem o júri presidido pela cineasta norte-americana Greta Gerwig inventou um estranho Prêmio Especial - que pareceu mais um troféu de consolação. Que se desse, pelo menos, um prêmio importante já existente, como o Grande Prêmio do Júri, que ficou para a produção indiana All we imagine as light, da diretora Payal Kapadia, ou do Júri, que foi atribuído ao musical Emilia Perez, do francês Jacques Audiard - este o único filme agraciado duas vezes, levando também um merecido prêmio de interpretação feminina para suas três atrizes, Zoe Saldaña, Selena Gomez e Karla Sofia Gascón, esta a primeira atriz trans premiada na história de Cannes.
Ao menos isso o júri fez direito. A Palma de Ouro ficou com o filme Anora (foto), uma divertida aventura policial do norte-americano Sean Baker.
Não premiar o filme de Rasoulof, que foi realizado nas condições mais difíceis, que incluíram a fuga do diretor do país, onde está condenado à prisão, parece uma grande falta de sensibilidade do júri com o espírito da época e com as qualidades da própria obra. Afinal, consiste de um contundente libelo contra a opressão e é extremamente bem-realizado, em termos de roteiro, fotografia, montagem e atuação, o que não é pouca coisa. Todas as suas sessões tiveram acolhida calorosa e não se falou de outra coisa na Croisette nos últimos dias. Mas o júri não ouviu ou se dividiu demais para ter coragem de premiá-lo como merecia e seria importante, tanto para o filme como para o diretor, que inicia agora sua vida de refugiado na Alemanha.
O prêmio de melhor ator ficou para outro norte-americano, Jesse Plemons, que realmente está muito bem no irregular Kinds of Kindness, do grego Yorgos Lanthimos. E foi bastante surpreendente a atribuição ao português Miguel Gomes do prêmio de direção por Grand Tour - surpresa mas justa, afinal, o filme é bastante sofisticado.
O prêmio de roteiro, finalmente, ficou para outro filme francês, The Substance, da diretora Coralie Forgeat, que teve destacado justamente seu ponto fraco, o roteiro. Mas este filme sanguinolento e excessivo merece ser lembrado ao menos pela intensa interpretação de Demi Moore, que veio pela primeira vez a Cannes e esteve em várias bolsas de apostas para a premiação como melhor atriz. Este ano, aliás, havia várias interpretações femininas de peso e qualquer uma delas poderia ter levado o troféu com méritos - inclusive a adolescente Nykyia Adams, protagonista do belo e sensível Bird, da inglesa Andrea Arnold - uma outra inexplicável omissão deste júri.
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