Cannes celebra Deneuve, Douglas e filme de época com pitada de escândalo
- Por Neusa Barbosa, de Cannes
- 17/05/2023
- Tempo de leitura 4 minutos
Cannes -
A 76a edição embalou na noite desta terça (16) com uma declarada intenção de consagrar os ícones, o que começou desde a escolha de Catherine Deneuve para ilustrar o cartaz da edição. A própria estrela, perto de completar 80 anos, esteve presente de carne e osso no palco, ao lado da filha, Chiara Mastroianni, apresentadora da noite de abertura - e que entrou no palco do Grand Théâtre Lumière cantando uma música em italiano, lembrando sua origem, seu pai, Marcello Mastroianni, e também dando a impressão de que nos encontrávamos em outro festival, Veneza no caso.

No mais, a apresentação transcorreu sem grandes problemas, graças à desenvoltura de Chiara no comando, sabendo lidar com pequenas confusões - como sua mãe ter esquecido de declarar aberto o festival, como mandava o protocolo. Lembrada pela filha, Catherine o fez em seguida, rindo. Chiara também foi solicitada a ajudar o veterano ator Michael Douglas, 78 anos, homenageado com a Palma de Ouro honorária por sua carreira, a fechar a caixa onde se encontrava o prêmio. Tudo de maneira muito informal e simpática.

Abertura de época
Fora de competição, mas abrindo o tapete vermelho numa cidade em que o prefeito proibiu os protestos contra a reforma da previdência que têm abalado a França, o drama de época Jeanne du Barry, de Maïwenn, iniciou as exibições. Veio já marcado pelos escândalos que abalam no momento a própria atriz e diretora - Maïwenn teria cuspido num jornalista - e seu protagonista, Johnny Depp, que acaba de sair de um longo e tóxico processo envolvendo sua ex-esposa, Amber Head, que ele venceu. Enfim, prato cheio para a mídia de fofocas, mas o que interessa é o filme - que é apenas razoável.
Verdade que tem qualidades. Jeanne du Barry resgata uma personagem histórica polêmica do século XVIII, amante do rei Louis XV (Johnny Depp) e faz, até certo ponto, um bom serviço. O filme tem uma produção refinada, filmado em Versalhes, com os melhores figurinos e penteados, e tem uma certa ironia quando lança um olhar sobre os rituais da corte francesa da época que ajuda a sacudir aquela poeira que não raro recobre as produções históricas.
Nos melhores momentos, o filme de Maïwenn deixa entrever o quanto aquela mulher, filha sem pai de origem pobre, não tinha lugar no mundo, embora não lhe faltassem inteligência nem energia. Teve, assim, que contar com seus talentos eróticos, tornando-se prostituta, depois amante do conde du Barry (Melvil Poupaud) - que finalmente tornou-se seu cafetão e fez de tudo para apresentá-la ao rei. Com o rei, no entanto, Jeanne pôde viver um grande amor, em tudo prejudicado pelas convenções da época.
Um grande achado nos personagens secundários é a figura de La Borde (Benjamim Lavernhe), o valete do rei que intermedia a convivência da amante com o rei e conhece todos os meandros desta corte altamente hipócrita. O ator rouba a cena em diversos momentos, em registros que vão do cômico ao mais emocionado.
Dito isso, é de se pensar se Maïwenn era a diretora ideal para extrair desta história todo o seu potencial e também se deveria ter sido ela a intérprete de Jeanne na maior parte do tempo. E a resposta seria não nos dois casos. Muito festejada na França, ela tem no currículo um Prêmio de Júri para seu primeiro filme como diretora, o regular Polissia (2011), além de arrebatar um prêmio de melhor atriz para Emmanuelle
Bercot em seu segundo filme, Meu Rei (2015). Mas toda essa celebração parece um tanto desproporcional. No máximo, ela é uma atriz e diretora bastante regular, nada mais. E este tipo de história precisava do talento digamos de uma Jane Campion para realmente ser marcante.
Bercot em seu segundo filme, Meu Rei (2015). Mas toda essa celebração parece um tanto desproporcional. No máximo, ela é uma atriz e diretora bastante regular, nada mais. E este tipo de história precisava do talento digamos de uma Jane Campion para realmente ser marcante.
Quanto a Johnny Depp, ele se sai até melhor do que o esperado na pronúncia do francês - afinal, foi casado com uma francesa, Vanessa Paradis -,
embora sua atuação nunca seja mais do que mediana. Parece que Maïewnn o escolheu mesmo para repetir algumas das caretas de seu personagem mais celebrado, o pirata Jack Sparrow.
embora sua atuação nunca seja mais do que mediana. Parece que Maïewnn o escolheu mesmo para repetir algumas das caretas de seu personagem mais celebrado, o pirata Jack Sparrow.
Imagem de Michel Douglas, Catherine Deneuve e Chiara Mastroianni: Getty Image
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